Apontamentos de 2005

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anibal_pires.jpgNão. Não se trata de uma retrospectiva! Primeiro porque gosto mais de olhar para o futuro e depois porque os “olhares” são abrangentes e aqui não cabe tudo o que a memória registou de bom e menos bom que foi acontecendo ao longo deste ciclo temporal que agora termina e que, por convenção, se designa: ano 2005.
Também não se trata de nenhuma análise global destes últimos trezentos e sessenta e qualquer coisa dias. Pretendo tão-somente enumerar alguns factos que não são notícia nem fazem manchetes nos “mass-media” ou, se o são, trazem sempre associados espartilhados juízos e conceitos de política e de desenvolvimento unívocos. Os acontecimentos que abaixo referencio contrariam, de algum modo, os “profetas” que anunciaram o fim da história e das ideologias e alimentam o sonho de quem resiste à tentativa de hegemonização do pensamento. Evo Morales é o novo presidente da Bolívia.
 
No dia 18 de Dezembro, Morales foi eleito democraticamente com 52% dos votos expressos. O país onde há 38 anos foi assassinado Ernesto “Che” Guevara, às mãos da CIA, elegeu para seu presidente um indígena oriundo de uma família de “cocaleros”, que promete ser mais um espinho na garganta da administração do patético George W. Bush e das oligarquias económicas. “O nosso Norte é o Sul” – lema de uma nova estação de televisão financiada pelo Brasil, Venezuela, Cuba, Argentina e Uruguay. A Telesur assume-se como um novo paradigma da comunicação de massas e, tal com a Al Jazira, constitui uma alternativa à formatada e padronizada informação produzida à “boa maneira” das televisões dos Estados Unidos e das subsidiárias europeias. O sinal da Telesur está aí e pode ser acedido sem custos através do satélite News Skies Satellite 806 e da Internet. Este projecto de televisão constitui, igualmente, um duro revés para a administração estado-unidense.
 
As Nações Unidas aprovaram uma resolução (mais uma) condenando e exigindo o fim do bloqueio económico a Cuba. Desta vez foram apenas 3 os países que votaram ao lado dos Estados Unidos – Israel, Ilhas Palau e Ilhas Marshall. Mais uma vitória de Cuba e um crescente isolamento da política externa dos Estados Unidos para a América do Sul e Caraíbas confirmada na cimeira ibero-americana e na visita do presidente dos Estados Unidos à Argentina onde a sua tentativa de revitalização da Área de Livre Comércio das Américas (ALCA) foi um fracasso. “Uma globalização para o bem-estar de todas as partes e não a favor de uma só e onde o diálogo é mais importante do que o choque no relacionamento dos países” afirmação do secretário geral da Liga dos Estados Árabes, Amre Mussa, proferida na cimeira América do Sul Países Árabes, promovida em Maio pelo Brasil, e que deixou e fora os Estados Unidos. Derrotados foram também os Estados Unidos, quando em Abril, a decisão da Organização Mundial do Comércio sobre os subsídios à produção e comercialização do algodão foi favorável ao Brasil e da qual beneficiaram os produtores latino americanos e pelo menos os produtores de quatro países africanos – Benin, Chad, Mali e República Centro Africana. Ficam, para vosso juízo, estes breves apontamentos de 2005 e os meus votos de que o novo ciclo temporal que se inicia no próximo Domingo seja de resistência à homogeneização do pensamento e de acreditar que o sonho é possível. O sonho de construir um futuro mais justo. Um Bom Ano de 2006!
 
Aníbal C. Pires em “Olhares” no Açoriano Oriental em 30de Dezembro de 2005