Intervenção de Anibal Pires no Campeonato das Profissões

pcp..jpgEscola Profissional de Capelas – 29 de Novembro de 2006
Quero, antes de mais, agradecer, em meu nome pessoal e do PCP Açores, à Escola Profissional de Capelas, na pessoa do seu Director, Dr. Artur Veríssimo, o convite que nos foi endossado para participar neste debate no âmbito do XVII Campeonato Regional das Profissões.

Saúdo os membros e o moderador deste painel, saúdo, igualmente, todos os presentes e manifesto o desejo que esta iniciativa possa contribuir para o aprofundamento do debate em torno das questões da Formação Profissional.
Antes de mergulhar nas reflexões que aqui venho partilhar convosco permitam-me uma saudação muito especial a todos os jovens açorianos. Aos jovens estudantes do ensino regular, aos jovens estudantes do ensino profissional e aos jovens trabalhadores.
Jovens a quem cabe por direito próprio: o futuro. Futuro que lhes desejo de sucesso enquanto cidadãos individualmente considerados mas, sobretudo um futuro colectivo que desejo seja caracterizado por maior justiça social e económica.
 
1.Introdução

Falar de educação, formação e qualificação profissional, isto é, da valorização dos recursos humanos une, ao nível da enunciação da sua importância estratégica para o desenvolvimento e crescimento económico, o discurso político e, é bem possível, que hoje, também, aqui o transpareça.
Não obstante, esta unanimidade é aparente, como penso que também no final do debate vai acabar por se tornar líquido.
Por detrás das escolhas e modelos que se implementam existem opções ideológicas que lhe dão sustentação. Ideologias que a pós modernidade procurou afastar do discurso político e público decretando-lhes o fim. Sendo que esse discurso, o discurso do fim a história e das ideologias, é, em si mesmo, um dos pilares que sustenta a ideologia dominante, ideologia uniformizadora do pensamento e do comportamento e que nos pretende transformar numa mole acrítica de meros factores de produção e consumidores formatados por necessidades construídas.
Também os modelos e sistemas educativos, a formação profissional e a qualificação ou requalificação de activos, aliás como em tudo na vida, têm associado uma opção ideológica.
Sendo que o tempo que foi destinado às intervenções iniciais e o debate que se vai seguir não permitirão aprofundar estas questões não podia, sob pena de contribuir para alimentar o discurso e o paradigma dominante, deixar aqui esta, necessariamente, breve e sumária referência.
O paradigma da Formação Profissional instalado na Região e no País não são inócuos e têm associada uma opção ideológica. E as suas marcas, as da ideologia que lhe está subjacente, são nalguns casos bem visíveis como procurarei evidenciar durante a minha intervenção.

2.Apontamentos sobre a Formação Profissional e o emprego nos Açores

Sendo inegável o avultado investimento público feito pela Região na Formação Profissional e na Formação de Activos e sendo, igualmente inegável a qualidade da formação desenvolvida por algumas unidades promotoras de formação profissional inicial de base e, de entre essas, a Escola onde nos encontramos é um exemplo paradigmático.
Mas, não obstante, este reconhecimento, bem assim como o confirmado contributo que este sub-sistema de ensino tem dado para a qualificação da população activa da Região subsistem, no entanto, alguns aspectos preocupantes, quiçá decorrentes dos aspectos a que me referi no ponto anterior, e dos quais realço:

- encaminhamento precoce, por vezes compulsivo, para o ensino profissional (refiro-me concretamente ao PROFIJ)
- pulverização da rede de Escolas Profissionais;
- acentuada diminuição das verbas para o financiamento da formação de activos; (decorre da anterior)
- forte dependência financeira dos fundos da União Europeia;
- ausência de critérios objectivos e rigorosos na abertura de Escolas e Áreas de Formação; (não é compreensível a abertura de uma Escola de Hotelaria no Hotel S. Pedro quando a Escola em que nos encontramos reúne (ou reunia) todas as condições para efeito)
- desregulamentação das condições de trabalho dos formadores em virtude de dependerem do Contrato Colectivo do Ensino Particular e Cooperativo (que engloba uma grande diversidade de organizações: Colégios, IPSS, Lares, Creches, etc)
- o modelo de financiamento (contra reembolso) penaliza formandos e formadores. Em algumas situações que os presentes conhecerão melhor que eu são os formandos e os formadores, ao invés dos promotores da formação, os investidores e financiadores.

Estes são alguns de entre outros exemplos que, não constituindo propriamente novidades, caracterizam de algum modo o paradigma implementado e os objectivos que lhe estão subjacentes.
Vivendo uma época em que o “ciclo dos saberes” tem um tempo de vida cada vez mais curto. (à 50 anos não se notava a necessidade de formação ao longo da vida, ciclo de saberes longo)
Os ritmos dos avanços científicos, técnicos e tecnológicos tornam obsoletos e insuficientes os conhecimentos, as competências e o domínio das técnicas e tecnologias, quase me atrevo a dizer que as mudanças ocorrem de um dia para o outro. Deste facto advém a seguinte questão: - Que modelo de formação profissional? E uma necessidade: - formação ao longo da vida.

Quanto à questão e ao modelo, independentemente, da real situação de mudança permanente importa ter sempre presente que só haverá Formação Profissional bem sucedida se for suportada por uma base académica que permita a contínua aquisição de saberes, a adaptação à contínua mudança e inovação tecnológica.
Promover Formação Profissional focalizada em perfis de competências e com a componente académicas desvalorizada é, em minha opinião, redutor. Mais importante do que a formação para perfis de competência técnica é educar e formar para o SABER APRENDER, o que só é possível se os formandos forem dotados ou, se lhes for ministrada, uma consistente base académica. O equilíbrio entre as componentes técnicas, tecnológicas e académicas é fundamental no desenho de qualquer modelo de formação profissional que se queira bem sucedida.

Quanto à necessidade, ou seja, a formação ao longo da vida, é já uma evidência e deve ser considerada um direito a que todos devem aceder. Devendo, por isso, a Região, o tecido empresarial e os sindicatos promoverem as condições necessárias para a sua efectivação.
As reflexões que tenho estado a partilhar convosco são todas elas a montante há, no entanto, algumas outras que se colocam a jusante do processo de formação profissional inicial de base.
Que reflexos do investimento em Formação Profissional no emprego real?
Que alterações no perfil das qualificações da população activa?
Que reflexos nas remunerações pagas pelos empregadores aos formandos qualificados?
Em suma que efeitos no emprego, nos vínculos laborais e na política de rendimentos do trabalho?
Também a jusante do processo de formação profissional, quer o inicial quer o de activos ou de desempregados, a realidade é diversa do discurso oficial.
A precariedade do trabalho tem vindo a aumentar e o rendimento dos trabalhadores a diminuir. Quanto ao emprego se é certo que algumas valências são quase totalmente absorvidas pelo mercado de trabalho é, igualmente, certo que o desemprego real é bem mais elevado que o que a taxa de desemprego nos quer fazer crer.

Não me refiro sequer à falácia que constituem alguns programas de formação e de estágios refiro-me apenas, e tão somente, ao facto de na população activa faltarem entre 15 a 20 mil cidadãos em idade activa.
É bem possível que neste significativo número de cidadãos em idade activa mas que não constam nem do número de inscritos nos Centros de Emprego, nem na população activa se encontrem alguns jovens com percursos de formação profissional a quem foram goradas as expectativas de um trabalho digno, com direitos e justamente remunerado.

Obrigado pela vossa atenção!
Capelas, 29 de Novembro de 2006