Em Abril passado, com a publicação do Livro Verde sobre a reforma da Política Comum de Pescas (PCP), a Comissão Europeia liderada por Durão Barroso, mas onde os maiores países põem e dispõem, deu início ao debate tendo em vista a adopção de uma nova PCP, prevista para o ano de 2012.
Com a entrada em vigor do Tratado de Lisboa, o debate a este respeito tornar-se-á tanto mais importante, quanto difícil. Tratado este que consagra como competência exclusiva da União Europeia (UE) a “conservação dos recursos biológicos do mar, no âmbito da política comum de pescas”, premissa tanto mais inaceitável, quando falamos de recursos que apenas dizem respeito aos países e à sua soberania, e ainda mais intolerável quando nos foi vendida pelos restantes partidos nacionais como uma mais-valia para o país e os portugueses, esquecendo oportunamente o reforço dos poderes das grandes potências europeias nos processos decisórios da UE, em detrimento dos países mais pequenos e menos populosos.
Na verdade, com a introdução destes processos, o que parece voltar a estar em cima da mesa, como já esteve em 2002 por proposta da Comissão Europeia, é a criação de direitos de propriedade privados para o acesso à exploração deste bem público, restringindo desta forma a alguns, aquilo que deveria ser de todos. A este respeito, gravoso para o país e em maior medida para a RAA, a atitude da relatora do PE e eurodeputada do PSD Maria do Céu Patrão Neves, a qual se inibiu de contestar tais medidas no seu projecto de relatório, o que não pode deixar de ser denunciado. No fundo, o que se quer fazer no sector das pescas, é centralizar em alguns países a gestão baseada em direitos de pesca, para a curto prazo passar esta responsabilidade para um mercado único de direitos de pesca ao nível da UE e, quem sabe, levar esta questão até à bolsa. Esta proposta, em última análise, levará à concentração de direitos em alguns operadores e a uma desmedida exploração dos mares, sem qualquer controlo por parte dos países.
Da parte do Partido Comunista Português e dos seus eleitos no PE, questões como a defesa dos direitos de soberania sobre as águas territoriais, as zonas económicas exclusivas e os fundos marinhos contíguos consagrados na Constituição da República Portuguesa, a rejeição de qualquer tentativa de privatização dos recursos marinhos e a efectiva introdução de mecanismos que melhorem o preço do pescado na primeira venda, similares aos preços de garantia ou às taxas máximas de lucro, o aumento do financiamento comunitário no âmbito da política comum de pescas, a manutenção das 12 milhas como zona de acesso exclusivo para as frotas nacionais de cada Estado-Membro, podendo estas ser alargadas consoante as plataformas continentais, a necessidade do apoio comunitário para a renovação e modernização das frotas de pesca, nomeadamente para a pequena pesca costeira e artesanal, e a necessidade dos custos de produção serem parte integrante na definição dos preços de orientação, são componente fundamental para a soberania dos povos e dos países nos mares, por um lado, e a manutenção e protecção dos ecossistemas piscatórios, mantendo-os imunes à especulação e exploração desenfreada, como parece ser agora, novamente, a vontade da Comissão Europeia e dos países mais poderosos da UE.
Artigo de opinião de Fernando Marta, publicado no blog http://umapalavraparaoprogresso.blogspot.com/