As propostas de Orçamento de Estado (OE) para o ano que decorre, acordadas entre o governo e a direita parlamentar, abençoadas por tudo o que é economista credenciado e bem colocado, político diletante ou simplesmente desempregado (da política, claro), e encomendadas pelos grupos económicos nacionais e transnacionais, pela banca, e pelo próspero sistema financeiro, são exactamente o oposto daquilo que o país quer e precisa, como o demonstrou o povo português ao retirar a maioria absoluta ao absolutista governo de Sócrates. Mais uma crise, as mesmas receitas.
Enfrentamos o futuro com um OE que tem de responder às enormes dificuldades que os portugueses enfrentam, com o avolumar do desemprego dos trabalhadores, nomeadamente os mais jovens, cujas dificuldades se acrescentam às que os pais já conhecem, tantas vezes ambos sem um posto de trabalho, e sem acesso ao subsídio de desemprego. Um OE que tem de pôr os mais ricos a pagar mais impostos, pondo os que recebem menos a pagar menos, aumentando com isso a justiça social. Um OE que aumente os salários e pensões mais baixas, dinamizando assim a economia e a produção interna. Um OE que fiscalize, como vem agora dizer a ministra do Trabalho, a correcta atribuição do Rendimento Social de Inserção, mas que fiscalize, também, as empresas com falências fraudulentas, as contribuições das grandes empresas, dos bancos e dos gestores para a Segurança Social ou os impostos devidos à máquina fiscal, por quem esmiúça as malhas da lei, para que assim a possa indevidamente contornar.
O receituário, agora conhecido, e proposto pelos mesmos de sempre, com vista a obrigar os trabalhadores a pagar mais esta crise, começa já a dar ares de fraqueza, e de efectivo desvio à nascença. Reduções nos investimentos do Estado, através do PIDDAC, congelamentos de salários de todos os trabalhadores, perda de poder de compra da maioria da população, logo menos consumo interno, mais penalizações para quem pretende aceder à reforma, o que levará, mais uma vez, ao aumento do desemprego e da precariedade, particularmente entre os mais jovens, restrição de entradas na Administração Pública, como mais um incentivo ao desemprego, a manutenção de uma branda fiscalização à fraude e evasão fiscal, ao crime económico e financeiro, às burlas e aos prémios milionários de gestores, como mais uma oportunidade de negócio. Agravam-se os impostos aos trabalhadores, e diminuem-se às empresas, parece ser este o rumo do OE 2010.
Nos últimos dias, a propósito destes e de outros problemas estruturais do país, ouvia o presidente da Associação de Bancos, António de Sousa, referir da necessidade de serem aumentados os impostos, directos e indirectos, sem qualquer discriminação positiva (para quem menos pode) ou negativa (para quem, como ele e a classe que representa, ganha milhões), com uma leviandade e desfaçatez próprias de quem não tem que contar os tostões ao fim do mês, se os tiver, com vista a pagar o empréstimo da casa, a escola dos filhos, a alimentação, o gás, electricidade, combustíveis e transportes, e todos os bens essenciais dos quais não podemos, não por luxúria, mas por necessidade, prescindir. Mas, para António de Sousa, este será um bom OE.
Artigo de opinião de Fernando Marta, publicado no blog "Uma palavra para o progresso"