![Aníbal Pires](/images/stories/APires_8Jul_2_web.jpg)
A introdução de taxas moderadoras, instaurando o princípio de doente-pagador, é assim um enorme retrocesso, que cria barreiras socioeconómicas no acesso aos cuidados de saúde, sendo também uma dupla tributação, pois os açorianos já pagam impostos que se destinam, entre outras coisas, a financiar o Serviço Regional de Saúde.
As taxas são uma medida profundamente injusta, que visa transferir para os utentes uma fatia ainda maior dos custos com a saúde, aliviando as contas do Governo Regional, que assim se financia à custa dos Açorianos doentes, vulneráveis e sem outra escolha senão pagar o duplo imposto! Entre Julho de 2011 e o final do ano de 2013 foram já mais de 5,3 milhões de Euros extorquidos aos doentes açorianos para pagar outra vez os custos do SRS.
INTERVENÇÃO DO DEPUTADO ANÍBAL PIRES
NO DEBATE DA PROPOSTA DO PCP PARA A ELIMINAÇÃO DAS TAXAS MODERADORAS NO SERVIÇO REGIONAL DE SAÚDE
9 de Julho de 2015
Senhora Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,
Senhor Presidente do Governo Regional,
Senhora e Senhores Membros do Governo,
A criação de um Serviço Regional de Saúde universal, gratuito, descentralizado e de qualidade foi um dos grandes progressos que a conquista da Democracia e da Autonomia trouxeram aos Açores e permitiu um enorme avanço civilizacional, traduzido em ganhos para a qualidade de vida, esperança de vida e condições de saúde da população.
Na génese do Serviço Regional de Saúde estava o objectivo de permitir a qualquer açoriano, independentemente da sua ilha e da sua condição económica, o acesso aos cuidados de saúde de que necessita.
Infelizmente, as políticas seguidas por sucessivos Governos Regionais e da República muito tem contribuído para o desviar desse fim, desvirtuando a sua natureza universal, criando condições diferenciadas de acesso em função de condicionantes geográficas e económicas.
Referimo-nos aos milhares de açorianos sem médico de família, ao encerramento de serviços de proximidade, aos elevados tempos de espera para cirurgia e consultas de especialidade, ao favorecimento da medicina privada em detrimento da oferta pública, o peso dos custos com medicamentos ou à crónica insuficiência de profissionais de saúde, a que acresce a sua desvalorização profissional e salarial.
Esta política de saúde separa os açorianos em duas categorias: os que podem pagar consultas e tratamentos no privado e os que têm de aguentar as suas maleitas em listas de espera durante meses.
No ano de 2011, o PS resolveu trair tudo o que prometera aos açorianos e que antes usava continuamente como motivo de propaganda, e impôs o pagamento de taxas moderadoras no Serviço Regional de Saúde.
O PS criou, assim, mais uma barreira, mais um obstáculo à igualdade no acesso aos cuidados de saúde nos Açores. Uma medida injusta, desigual, que visa transferir para os utentes uma fatia ainda maior dos custos com a saúde, aliviando as contas do Governo Regional, que assim se financia à custa dos Açorianos doentes, vulneráveis e sem outra escolha senão pagar o duplo imposto! Entre Julho de 2011 e o final do ano de 2013 foram já mais de 5,3 milhões de Euros extorquidos aos doentes açorianos para pagar outra vez os custos do SRS.
E trata-se verdadeiramente de uma dupla tributação. Os açorianos já pagam os seus impostos que se destinam a suportar os custos do sistema. Mas vem o PS e, por cima disso, impõe-lhes taxas moderadoras, fazendo-os pagar duas vezes o que muitas vezes não têm: uma resposta de saúde rápida e de qualidade na sua própria ilha!
O PS orgulha-se que existam na nossa Região mais de 70.000 utentes isentos das taxas moderadoras por carência económica, sem se aperceber o quanto esse número demonstra o imenso desastre social que vivemos. Numa Região com 246 mil habitantes ter 70 mil carenciados, quase 30% do total é obra, especialmente se levarmos em conta que esses critérios apenas abrangem os açorianos de menores rendimentos, deixando de fora grandes margens da população que sofrem enormes dificuldades, apesar de ganharem um pouco acima dos mínimos.
Depois, afirma o Secretário que as taxas são positivas porque são reinvestidas no aumento da qualidade do serviço. Poderíamos perguntar onde estão essas melhorias, que não são fáceis de ver, mas cremos que a pergunta importante é: Então esse aumento da qualidade dos Serviços de Saúde não compete ao Estado? Então o Governo Regional limita-se a pagar o funcionamento mínimo e os utentes que paguem o resto?
Este é um assunto demasiado sério para ser tratado com leviandade. O que se trata aqui é de aliviar os custos suportados pelo Orçamento Regional à custa dos açorianos doentes! O que os senhores praticam, à margem do direito e da Constituição é um princípio neoliberal de doente-pagador. Se assim é, então, de uma vez por todas, assumam-no!
Senhora Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,
Senhor Presidente do Governo Regional,
Senhora e Senhores Membros do Governo,
A desculpa oficial invocada para a existência de taxas moderadoras é a de evitar “abusos”, de moderar as solicitações “não justificadas”, colocando os utentes na posição paradoxal de se terem de dedicar ao auto-diagnóstico: “Estarei suficientemente doente para que se justifique pagar a taxa moderadora?”, a que se segue necessariamente a outra inevitável pergunta: “tenho dinheiro para a taxa moderadora?”
Como bem aponta o parecer da Secção Regional da Ordem dos Médicos, as taxas moderadoras são também imorais no plano da ética, porque se destinam a demover as pessoas de recorrerem aos serviços de saúde. Beneficiam duplamente os serviços de saúde: reduzem o número de utentes e geram receitas. Mas prejudicam duplamente os açorianos, que têm de pagar por um direito humano básico que é garantido constitucionalmente.
Senhora Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,
Senhor Presidente do Governo Regional,
Senhora e Senhores Membros do Governo,
As taxas moderadoras são a solução simples para os problemas que não se quer resolver.
Em vez de se enfrentar o problema de falta de profissionais médicos, em vez de se investir na medicina preventiva e na promoção de estilos e escolhas de vida saudáveis, em vez de se dotar os centros de saúde dos meios que precisam para dar respostas rápidas e eficazes aos utentes, em vez de se reduzirem as listas de espera, impõem-se taxas, reduz-se o número de utentes, embolsam-se receitas extorquidas aos açorianos que não têm outra opção e, tudo parece ir bem, no melhor dos mundos possíveis, tudo pintado de cor-de-rosa.
Assim, as taxas servem também para que não se resolvam os problemas do SRS e se deixe tudo como está.
Ao contrário, defendemos que o Sistema Público de Saúde dos Açorianos precisa é de uma política diferente, assente em propostas que já tivemos ocasião de apresentar neste Parlamento, mas das quais sublinho:
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Dar prioridade ao investimento público na prevenção e na medicina familiar e de proximidade;
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reforçar a rede local de atendimento de saúde, como forma de aproximar dos cidadãos os cuidados de saúde e prevenção;
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A Planificação e a participação dos agentes e sujeitos do SRS têm de ser os mecanismos essenciais sistema, nomeadamente com a criação dos Conselhos de Saúde de nível Local, de Ilha e Regional e com um Plano Regional de Saúde feito de baixo para cima, ao contrário do que acontece atualmente, com base na densificação dos perfis de saúde locais, e escutando as preocupações e perspetivas dos Conselhos Locais de Saúde;
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É necessário valorizar os profissionais do Serviço Regional de Saúde e o seu papel enquanto agentes ativos de promoção da saúde e de proteção das populações, suprir as carências de diversos profissionais, nomeadamente de médicos e de enfermagem e melhorar os incentivos à fixação e formação médica. É também importante desenvolver mecanismos de gestão centralizada do pessoal no respeito pelos direitos dos trabalhadores e favorecendo os regimes de contratação coletiva.
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Sobretudo, é urgente criar uma nova filosofia de financiamento do Serviço Regional de Saúde, ou seja, a afectação dos recursos financeiros públicos, que são cobrados aos açorianos por via fiscal, para acabar com o crónico subfinanciamento e garantindo que o financiamento futuro, assegurado em quadro plurianual, cobre integralmente as despesas previstas e os investimentos planificados.
Esta é política alternativa que o Serviço Regional de Saúde e os açorianos precisam! Não é de taxas que criam barreiras socioeconómicas, inibidoras e injustas, no acesso aos cuidados de saúde, sem trazer qualquer benefício financeiro apreciável à sustentabilidade do SRS, que os utentes já financiam por via dos seus impostos.
Disse!
O Deputado do PCP Açores
Aníbal Pires