Na sua intervenção no Encontro Regional da CDU, Catia Benedetti, candidata pela ilha de São Miguel, afirmou que "Em São Miguel é particularmente visível a carência económica e social em que vive uma grande parte da população, e é particularmente chocante o número de pessoas que são abandonadas à margem de um mecanismo de produção de lucro cujos benefícios se distribuem finalmente entre poucos."
Catia Benedetti referiu-se também à situação dramática da agricultura e das pescas e, em relação ao sector do turismo, questionou: "Será que a grande quantidade de visitantes trouxe uma melhoria significativa nas condições de vida dos micaelenses em geral? O que de certeza está a acontecer é, mais uma vez, uma migração da riqueza gerada para fora da Região e do País, e uma grande precariedade de vida entre os trabalhadores do sector."
Intervenção de Catia Benedetti
Candidata da CDU pela ilha de S. Miguel
Camaradas e Amigos,
Obrigado a todos por terem vindo. E umas boas-vindas especiais aos nossos camaradas Jerónimo de Sousa, Secretário-geral do PCP, e Jorge Cordeiro, do Comité Central, num dia para nós muito especial. Soube que o João Decq Mota, no Faial, já sublinhou a importância que isto tem para nós, e eu gostaria de repetir aqui as palavras dele: esta presença faz-nos sentir a força solidária de milhares de homens e mulheres do continente que estão connosco, empenhados na mesma luta, e mostra bem como trabalhamos e o que somos: um só Partido, que luta unido, com a mesma coerência e com a mesma firmeza em todos os lados, em todas as frentes. Ao contrário de outras forças políticas, nós não dizemos uma coisa nos Açores e outra diferente na República.
É assim especialmente animador um momento como este, em que camaradas e amigos de todas as ilhas se encontram, se abraçam, trocam finalmente de pessoa aquelas opiniões e mensagens que diariamente trocamos por outros meios: porque, se é verdade que as distâncias nunca nos impediram, nem nos hão de impedir nunca, a discussão coletiva de todos os assuntos – pelo contrário, esta é uma prática que nos carateriza, e que nos distancia daqueles que entendem a democracia apenas como uma questão formal - não menos verdade é que sabe bem, que nos dá força e alento a proximidade afetuosa e real entre nós. E que esta seja de bom auspício para nós e para todos os Açorianos, que bem precisam de unidade entre si, pois não há dúvida que os bairrismos e as separações artificiosamente cultivados são um dos principais instrumentos a que recorrem os poderes instituídos, para a manutenção dos seus privilégios.
Para nós, a coesão entre as ilhas e a solidariedade entre Açorianos, do Corvo a Santa Maria, não são apenas bonitas palavras: o nosso programa regional, para o qual confluem os 9 programas de ilha, demonstra isto mesmo. E demonstra como nós fazemos as coisas, e como as faremos se os Açorianos entenderem reforçar a nossa presença na Assembleia que dentro de pouco irão eleger.
Poderão constatar que, ao lado de muitas medidas por nós defendidas, e que são comuns ao Arquipélago no seu conjunto, outras há que identificam em concreto as necessidades de cada ilha, A mim compete-me apresentar o programa para São Miguel, e o compromisso com os eleitores micaelenses. Não sendo possível fazê-lo com a minúcia desejável – mas o documento escrito fica ao dispor de todos – gostaria de sublinhar algumas especificidades, enquadradas sempre nesta constatação geral: São Miguel é a ilha com maior número de habitantes, e isto implica toda uma série de consequências positivas e negativas.
Ao lado daquilo que é impossível não ver – o facto de que aqui se concentram muitas realidades institucionais e económicas, e, portanto, oportunidades e dinâmicas positivas para a vida das pessoas– surge o seu reverso: o crescimento, conduzido numa dimensão essencialmente capitalista, demonstra aqui toda as suas falhas e contradições. Em São Miguel é particularmente visível a carência económica e social em que vive uma grande parte da população, e é particularmente chocante o número de pessoas que são abandonadas à margem de um mecanismo de produção de lucro cujos benefícios se distribuem finalmente entre poucos.
Quando falamos de agricultura ou pescas, e propomos aquelas medidas que o nosso programa regional ilustra, aqui em São Miguel temos em conta a recaída dramática da sua falta: porque cada erro, aqui, envolve logo milhares de pessoas e de famílias, que nenhuma diversificação produtiva poderá auxiliar no breve e médio prazo.
É por estas razões, entre outras, que salientamos a necessidade de uma nova fábrica para a SINAGA, por exemplo. Não apenas para a manutenção dos postos de trabalho existentes, mas pela criação de muitos mais, implicando também o desenvolvimento de sectores da agricultura que já no passado demonstraram ser rentáveis: a beterraba, a chicória, e o mais que una unidade de transformação moderna poderia valorizar. Mas nada disto pode constituir uma desculpa para não insistir na adoção de medidas urgentes que aliviem a crise do sector leiteiro, com todos os seus reflexos na indústria que aqui, como sabem, tem uma expressão significativa e envolve muitos trabalhadores.
Nas pescas, o panorama é completamente dramático. É especialmente em São Miguel, onde se concentra o maior número de pescadores da Região, acrescido de todos quantos se viraram para esta atividade depois de terem perdido os seus trabalhos noutros sectores, que as políticas até agora seguidas pelos sucessivos governos do PSD e do PS revelam toda a sua insustentabilidade. Foram investidos fundos impressionantes, mas as capturas baixaram, os custos de produção e os custos burocráticos atingiram proporções nunca vistas, a vida dos pescadores piorou até níveis dificilmente imagináveis, Nem houve melhorias pelo lado dos consumidores: pelo contrário, à mesa das famílias açoriana o peixe é um produto de luxo. Não creio que se possa esperar mais para virar a página, pondo de lado políticas sem perspetiva e decisões avulsas motivadas por razões essencialmente eleitoralistas. Se os pescadores, os cientistas e todos os outros intervenientes do sector assim o quiserem, a CDU empenha-se em devolver-lhes a decisão: é necessária e não mais adiável uma reestruturação completa desta atividade. Não aceitamos que se deixe pura e simplesmente morrer, quando no nosso mar as frotas estrangeiras retiram lucros consistentes dos nossos recursos.
Uma última palavra para o sector do turismo, que é um bom exemplo acerca do significado real da palavra crescimento. Será que a grande quantidade de visitantes que todos podemos constatar trouxe uma melhoria significativa nas condições de vida dos micaelenses em geral? Com uma exceção ou outra, não parece que tal esteja a acontecer. O que de certeza está a acontecer é, mais uma vez, uma migração da riqueza gerada para fora da Região e do País, e uma grande precariedade de vida entre os trabalhadores do sector.
E é com a palavra precariedade que quero concluir esta intervenção, não apenas para constatar como esta se tornou a condição de vida de um enorme número de pessoas, a todos os níveis, incluindo o trabalho no sector terciário, na saúde e na educação: programas de estágio, contratos a termo, meias contratações, recibos verdes, e o que mais pôde ser inventado para permitir que a incerteza e a carência se tornassem um flagelo não só para quem está no desemprego, mas mesmo para os que trabalham, são as formas que adquiriu uma cultura económica que mais não é do que um regresso ao antigamente, no que de pior, com isto, se possa entender.
Contra isso nós não nos cansaremos de lutar: e está prevista, mesmo para a próxima sexta-feira, uma nossa intervenção pública nesta matéria, junto do Centro de Emprego. Esta e outras ações de campanha querem transmitir aos micaelenses e aos açorianos qual é o rumo que a CDU indica: dependerá deles dar-nos a força suficiente para que este rumo possa ser seguido, a bem das nossas comunidades. A nós cabe-nos sermos claros e decididos nesta mensagem, cabe-nos esclarecer a importância e a necessidade de um voto realmente útil para que as pessoas recuperem dignidade e alegria. Não temos ilusões quanto à dificuldade da nossa ação, mas estamos aqui, juntos e serenos, para a levar ao cabo, em São Miguel como nas outras ilhas.
24 de Setembro de 2016