Camaradas,
No X Congresso, a Organização de São Miguel apresentou uma intervenção que focava sobretudo as precárias condições de vida e de trabalho de grande parte da população. Nos anos que entretanto passaram, não se assistiu infelizmente a nenhuma melhoria, bem pelo contrário.
Testemunhamos o surgimento de uma grande ilusão coletiva em volta da riqueza que o turismo traria à ilha, e o enfraquecimento do setor produtivo, em primeiro lugar da agricultura e das pescas.
Aconteceu aquilo para o qual o PCP vinha alertando: São Miguel chegou a estar tomada de assalto pelos turistas, mas para a generalidade dos micaelenses resultaram lucros marginais. A ocasião não foi sequer aproveitada para a orla costeira marítima nem para recuperar a zona das Calhetas, em Ponta Delgada, enquanto se assistia a uma subida especulativa do custo de vida que, esta sim, foi sentida por todos.
Em matéria de postos de trabalho, a precariedade e a sazonalidade continuaram a ser a regra, e em certas épocas do ano os trabalhadores ligados diretamente ao setor sentiram na pele os efeitos de uma exploração que, em alguns casos, foi brutal.
Veio depois o Covid, e muitas das atividades então abertas, especialmente por micro e pequenos empresários, tiveram de fechar. Mais recentemente uma outra e gravíssima crise desenhou-se no nosso horizonte, e já todos nos apercebemos dos enormes riscos com que estamos confrontados. Só o aumento do preço dos combustíveis, sem falarmos já de outros aspetos, está a originar um autêntico descalabro financeiro em vários setores económicos e muitas famílias. O que não se vê, por parte de quem nos governa, é a consciência clara disso.
Parece que tudo aquilo por que passámos não lhes ensinou nada. Não está sequer a ser considerado aquilo que é essencial: isto é, começar a reconstruir todas aquelas atividades produtivas perdidas em prol de um processo de terciarização forçado. Não está nos planos deste governo, como já não esteve nos planos e na prática dos anteriores, explorar aquelas possibilidades concretas que existem na ilha para garantir a sua segurança alimentar e energética e ao mesmo tempo a ocupação.
Estamos por exemplo a falar de uma frota de pesca eficiente, capaz de fornecer pescado a um país que é deficitário neste produto de primeira necessidade. Ou na possibilidade sempre descurada de produzir as hortícolas que continuamos a importar. Nem a agricultura nem as pescas recebem outra mensagem que não seja a de reduzirem a produção. A indústria transformadora foi dizimada. Não se conhece, na realidade, nenhum plano económico que se proponha seriamente estimular a produção de seja o que for.
As desigualdades continuam gritantes, como talvez em nenhuma outra ilha do nosso arquipélago. Fala-se muito dos rendimentos sociais de inserção, mas poucos gostam de reconhecer que uma grande parte destes rendimentos são destinados a pessoas que na realidade trabalham. O que se passa é que recebem tão pouco que não poderiam subsistir sem estas ajudas.
O resultado deste desequilíbrio social vê-se e sente-se nas ruas, não só nas nossas três cidades, Ponta Delgada, Ribeira Grande e Lagoa, mas também nas vilas e nas freguesias mais pequenas. Temos um grande número de jovens que não completaram a sua escolaridade, ou que obtiveram qualificações apenas administrativas, sem a aquisição de competências reais. São jovens sem trabalho estável, e sem nenhuma defesa psicológica e cultural contra a oferta de álcool e drogas que os rodeia: são os protagonistas daquele aumento de pequenos crimes que tanta insegurança está a gerar nas populações. Uma vez o mal instalado, faz todo o sentido reclamarmos, como reclamamos, uma maior presença policial de proximidade, aumentando os efetivos e os meios das forças da ordem. Mas este não é, na sua raiz, um problema de polícia. Trata-se sim de um problema social, só possível de ser enfrentado alterando o modelo económico atual e a distribuição de riqueza.
No meio desta realidade, o nosso trabalho não é fácil. Quem mais beneficiaria da nossa ação é quem está mais desencantado, mais amargurado, e ao mesmo tempo mais desprovido de instrumentos críticos que lhe permitam interpretar a realidade, e entender que as suas carências não são frutos do destino, mas resultam de escolhas políticas que urge combater. Contudo, é este trabalho que temos de desenvolver, e que estamos a organizar com bases renovadas, contando com alguns novos camaradas e uma mais eficiente cobertura territorial, finalmente com três focos de dinamização: não só Ponta Delgada, mas também a Ribeira Grande e o Nordeste. Teremos de nos esforçar muito para alargar o nosso trabalho na Lagoa e na Vila Franca, as zonas que atualmente são mais problemáticas. Mas lá iremos, e continuaremos a lutar diariamente.
Viva a Juventude Comunista Portuguesa!
Viva o PCP!