Declaração de Jerónimo de Sousa, Secretário-geral do PCP sobre a reunião do Comité Central

pcp..jpgO Comité Central analisou a situação política do País e, em particular, as consequências dos resultados eleitorais de 20 de Fevereiro e a nomeação do XVII Governo, e prosseguir a preparação das eleições autárquicas e a concretização das orientações e medidas decididas pelo XVII Congresso, de reforço do Partido.
O Comité Central confirma as preocupações por nós já expressas tanto na campanha eleitoral como após as eleições, face à obtenção da maioria absoluta pelo Partido Socialista, de que a vitória do PS não garante a efectiva mudança de política que os portugueses reclamaram com o seu voto e de que o País necessita. Por outro lado, sendo certo que mais do que os titulares dos cargos importa avaliar as políticas concretas, a composição do governo acentuou as inquietações existentes, tendo em conta o peso no elenco ministerial de anteriores membros de governos PS, comprometidos com a aplicação de políticas de direita em questões fundamentais, que foram aliás sancionadas pelos portugueses, bem como a estreita ligação de alguns dos actuais membros do governo ao sector financeiro, a grandes grupos económicos ou a uma acérrima defesa de orientações e políticas neoliberais.
 
O Programa do Governo, agora apresentado, seguindo de perto o programa eleitoral do Partido Socialista, não responde às necessidades do país, dos trabalhadores e das populações e não corresponde à vontade de mudança real para que o resultado das eleições de 20 de Fevereiro apontou. Faltam, no Programa do Governo, indispensáveis rectificações da maioria das mais graves medidas avançadas pelo Governo PSD/CDS-PP, tais como da Lei de Bases da Segurança Social, da entrega de novos hospitais a privados, do regime de trabalho da Administração Pública. Sem prejuízo de se anunciarem algumas medidas positivas, não há sequer qualquer referência à valorização do Salário Mínimo Nacional, à convergência das pensões mais baixas com o mesmo, à defesa dos serviços públicos essenciais, ao fim da política de privatizações, à limitação dos benefícios fiscais da banca e sector financeiro, ou à anulação do exame do 9º ano previsto para o final do ano lectivo.
 
Não há também quaisquer orientações concretas em relação à grave situação que enfrenta o sector têxtil nacional. Confirmam-se igualmente, e desde já, orientações políticas negativas, como a continuação de uma gestão orçamental restritiva e conforme as orientações do Pacto de Estabilidade, a alteração das leis eleitorais para a Assembleia da República e para as autarquias locais, a aceitação da Constituição Europeia e da Estratégia de Lisboa, o aumento da idade de reforma e o nivelamento das condições de reforma na administração pública com as do regime geral da segurança social, o adiamento da regionalização e a opção pelo referendo da despenalização da IVG em lugar da alteração da Lei na Assembleia da República. O Programa de Governo agora apresentado permite prever que será necessário um forte empenhamento na intervenção social e política no sentido de contrariar a continuação de políticas de direita e defender a aplicação de verdadeiras políticas alternativas, batalha que contará com o empenho e a iniciativa do PCP. O Comité Central considerou muito preocupante que, face aos graves problemas que enfrentam os portugueses, decorrentes de dezenas de anos de políticas de direita, se continue a insistir nas teorias dos sacrifícios e da austeridade para os trabalhadores.
 
As primeiras declarações de ministros e do próprio primeiro-ministro na tomada de posse, são parte de uma campanha destinada a que o povo, e em particular os trabalhadores, interiorizem a crise e se disponham, em seu nome, a aceitar mais e novos sacrifícios. A reedição da teoria da crise e das dificuldades do País, que de novo está a ser ensaiada, deve ser prontamente denunciada e combatida, pois a vida continua a demonstrar que a crise e os sacrifícios não são para todos como fica bem patente nos resultados líquidos dos bancos e empresas seguradoras de 2004, mais 16% que no ano anterior e os milhões de euros de lucros, por exemplo, do conjunto das empresas energéticas (EDP e GALPenergia) ou da PT, enquanto se favorece o congelamento dos salários, aumenta a pobreza e o desemprego. O Comité Central exige urgentes respostas do governo para um conjunto de problemas com que os trabalhadores e as populações se confrontam, porque a vida não parou e a ofensiva mantêm-se nos seus traços essenciais. Prosseguem as tentativas de destruição do aparelho produtivo nacional, de imposição de baixos salários, de flexibilização de horários de trabalho ou de destruição de centenas de postos de trabalho, a pretexto de reestruturações, de que são exemplo a Bombardier, a Opel, a Yazaki e a PT, entre outras, enquanto no sector têxtil e do vestuário se vive uma grave situação, com despedimentos, encerramento e deslocalização de empresas.
 
Não é um sinal positivo o que está a acontecer na Bombardier. Assume um carácter muito grave e que pode marcar o início do mandato deste governo a ida da polícia de choque para a empresa. Mais grave seria, se ao que tudo indica, tal deslocação vier a dar cobertura à retirada das máquinas decisivas para que a empresa retome a laboração. O Comité Central chamou à atenção para um outro conjunto de problemas a que urge também dar resposta com relevo para a grave situação que o país enfrenta na consequência de um prolongado período de seca, em simultâneo com a ocorrência de muito baixas temperaturas e geadas, que já liquidaram na prática o ano agrícola, e trazem elevados riscos, de quantidade e qualidade, ao abastecimento público de água. O Comité Central, mesmo tendo em consideração o imponderável das flutuações climáticas, não pode deixar de denunciar vivamente as responsabilidades da política de direita de sucessivos governos, por gravíssimos atrasos, erradas orientações e insuficiência de investimentos na política da água, em todas as suas dimensões, e no desenvolvimento do projecto de Alqueva. O Comité Central reclama a rápida concretização de um Programa Nacional de Emergência que permita responder aos problemas existentes e atalhar com medidas preventivas a possíveis carências de água no abastecimento público e a uma mais profunda destruição do potencial produtivo do sector agro-pecuário. O Comité Central considera ser necessário afirmar e reclamar que o respeito pelo sentido profundo do voto dos portugueses a 20 de Fevereiro exige uma verdadeira mudança das políticas para o País. Mudança que permita responder às gritantes desigualdades sociais e assimetrias regionais, e vencer atrasos estruturais acumulados pelas políticas de direita. Mudança que permita dar resposta imediata e urgente a questões prementes que o País e os portugueses enfrentam. O PCP não se limita nem limitará à denúncia.
 
No quadro político, social e económico de profundos antagonismos, e numa linha de coerência com as conclusões do XVII Congresso e o que defendeu durante a campanha eleitoral, o PCP reafirma que vai dentro e fora da Assembleia da República, prosseguir a sua acção em defesa dos interesses dos trabalhadores, dos seus direitos económicos e sociais, e das condições de vida dos portugueses. Como iniciativas legislativas, apresentou já um conjunto de projectos, que a serem aprovados contribuirão para dar resposta a gravíssimos problemas com que o País se defronta – a revogação do Código do Trabalho, e em particular das normas da contratação colectiva, a despenalização da Interrupção Voluntária da Gravidez (IVG), a urgente substituição do Pacto de Estabilidade, a defesa da indústria têxtil, a superação da política de baixos salários, pensões e reformas, a necessidade de uma real melhoria nas condições de vida do nosso povo. O PCP continuará ao lado dos trabalhadores na luta pelas suas justas reivindicações e aspirações, pelo emprego com direitos, pela melhoria dos salários reais, pela dignificação do trabalho. O Comité Central procedeu a uma primeira avaliação ao andamento do trabalho de preparação das eleições autárquicas no período posterior às legislativas e definiu as principais linhas de trabalho e orientações com vista à dinamização da CDU, e à sua afirmação como um amplo espaço de participação e de envolvimento unitário.
 
O trabalho de preparação das listas a apresentar aos órgãos municipais e ao maior número de freguesias, a decidida acção de alargamento da CDU e de dinamização das suas estruturas locais, a prestação de contas da actividade realizada, a elaboração dos programas eleitorais a apresentar na base de um processo participado, a indispensável programação do trabalho eleitoral a desenvolver nos próximos meses, são tarefas a inscrever como prioridades no quadro da acção do Partido e das suas organizações locais. No sentido de uma afirmação nacional da CDU e do seu projecto, o Comité Central decidiu agendar para Maio de uma Jornada Nacional da CDU. O Comité Central regista com preocupação as propostas e intenções anunciadas nos últimos dias pelo PS e PSD. A proposta do PS, no sentido de fazer confluir no mesmo dia as eleições autárquicas com um acto de natureza referendária, tem associado um claro expediente de, com claro prejuízo para a percepção e juízo sobre as diversas propostas e projectos autárquicos, reduzir o referendo ao Tratado Europeu a uma mera formalidade, sem possibilidades de contribuir para vencer o enorme défice de esclarecimento e informação que existe sobre a matéria. A proposta do PSD quanto a uma revisão da lei eleitoral para as autarquias corresponde a uma tentativa mais de adulteração do carácter democrático e plural do poder local. A insistência neste objectivo, traduzindo concepções hegemónicas e de poder absoluto, não pode deixar de ser objecto de uma clara recusa e oposição.
 
O Comité Central analisou e deu particular atenção às questões de organização partidária, tendo salientado a necessidade da concretização das orientações definidas no XVII Congresso que apontou ao colectivo partidário o objectivo de proceder à adopção de um conjunto integrado de medidas do reforço do Partido que permitam o aumento da sua eficácia, organização e intervenção. Neste âmbito deu destaque, entre outros, à necessidade de se proceder à finalização da acção nacional de contacto com os membros do Partido; ao avanço de medidas de direcção e quadros para o reforço da organização e intervenção do Partido nas empresas e locais de trabalho; ao reforço da estruturação, em particular da estruturação da base do Partido; à realização de uma campanha de recrutamento de 2 500 novos militantes, até Março de 2006, mês em que se assinala o 85º Aniversário do PCP e à dinamização da imprensa partidária, em particular da difusão do Avante. O Comité Central decidiu com vista ao reforço da intervenção e influência do Partido considerar e calendarizar desde já, a par da acção política geral e do esforço da preparação das eleições autárquicas, um conjunto de linhas de intervenção, das quais se destacam: O desenvolvimento da iniciativa política do Partido na Assembleia da República na concretização dos compromissos assumidos com os trabalhadores e o povo português e no Parlamento Europeu designadamente em torno da oposição às directivas sobre organização do tempo de trabalho, do mercado interno dos serviços visando a sua liberalização, do accionamento da cláusula de salvaguarda do sector têxtil, do combate ao tratado sobre a dita constituição europeia.
 
O trabalho para que as comemorações do 25 de Abril e do 1º de Maio constituam momentos significativos na denuncia da situação do país, na resposta aos problemas nacionais, na exigência que se concretize o desejo de mudança evidenciado pelo povo português nas eleições legislativas, na comemoração e defesa da liberdade e do regime democrático-constitucional. O apoio à realização das acções de solidariedade com os povos em luta, nomeadamente a valorização das iniciativas que hoje (19 de Março) se realizam contra a ocupação do Iraque e os projectos de agressão do imperialismo a outros países; A promoção de iniciativas de comemoração do 60º Aniversário da Vitória sobre o nazifascismo (8/9 de Maio) um dos acontecimentos marcantes do século XX, promovendo a reflexão e o debate sobre o quadro internacional em que se desencadeou a II Guerra Mundial, valorizando a acção das forças de libertação, da resistência dos povos, o papel dos comunistas e o contributo da URSS e do Exército Vermelho para libertar a Europa e o mundo do flagelo do nazifascismo, combatendo as tentativas de revisão da História e o seu aproveitamento pelo imperialismo para justificar hoje a sua estratégia agressiva de domínio planetário.