Contrariando os apologistas da teoria do aquecimento global, este Inverno e esta Primavera apresentaram-se diferentes do habitual. E, a partir de certa altura, o vulcão islandês também ajudou...
Num Portugal coberto de cinzas, Maio tem estado frio.
Neste Portugal onde se organiza, curiosamente em simultâneo com a visita (pedindo bênção?) papal, um conselho de ministros para decidir e anunciar medidas que satisfaçam a gula de cinzentas agências mercenárias e especulativas internacionais, ditas de “ranking”, visando impregnar com mais nuvens carregadas de cinza e borrasca a vida próxima dos seus habitantes.
Chamada pelos sócratinos artífices de intempéries, sob o fechar de olhos cúmplice do PSD de Ferreira Leite, aproximou-se lentamente do país uma primeira nuvem do Plano de (in)Estabilidade e (de)Crescimento. Mas, em poucos dias, logo os olhos do PSD se arregalaram para a oferta de uma aliança de salvação nacional, proporcionando àqueles mesmos sócratinos artífices ganharem a coragem e o alento que lhes faltava para carregar e apressar a chegada das restantes.
Um velado aumento nos impostos, a alienação de património público rentável e estratégico, umas machadadas no crescimento económico, no emprego, nas condições de vida dos trabalhadores e nas pensões dos reformados, assim começou por ser o “tímido” PEC sócratino. Apoiando inicialmente de forma envergonhada (mas decisiva, note-se) estas pretensões, o PSD, rejuvenescido e animado pela nova liderança, está agora em campo de olhos e braços abertos para acelerar e turbilhonar, em aliança com o PS, a aplicação deste plano nebuloso e cinzento que já pairava no ar.
É um frenesim de personalidades prontas para salvar o país (que o povo, esse não é para aqui chamado): São economistas, todos eles altos responsáveis pela crise em que desembocámos, reunidos para consulta por Cavaco e Silva. São barões pêpêdianos arregimentados por Passos Coelho, para se concertarem. São “analistas” e “agentes económicos” a propor, por encomenda, soluções óbvias e incontornáveis ao governo. É enfim o Conselho de Ministros do PS que, confiante no apoio deste povinho personalizado, mais do que no anónimo, se apronta para entrar pelas portas que o PSD agora lhe escancara.
E para decidir mais o quê? Medidas fortes defende Rebelo de Sousa!
Que afinal os salários não são só para congelar, mas também para cortar? Que afinal o IVA é para aumentar? Que o 13º mês é para ser mutilado?
Até podem decidir sobre a insolvência do país e decretar o empobrecimento geral (o que aliás em parte já acontece), pois isso advém da própria natureza e conveniência da gestão política do capitalismo, mas uma coisa é certa, não basta decidir para garantirem que se concretize o que quer que seja. Muito menos pacificamente, quando o alvo é a vida de todo um povo que, apesar de ser anónimo, também faz história quando a isso se vê obrigado.
É que ao mínimo desvio da nuvem de cinzas, os aviões levantam e seguem o seu destino…
Artigo de opinião de Mário Abrantes, publicado no jornal "Diário dos Açores" na sua edição do dia 13 de Maio de 2010