Enquanto as medidas de austeridade impostas à maioria dos portugueses galopam e se multiplicam ao ritmo dos entendimentos nacionais entre o Governo do PS e o PSD, dir-se-á que por cá, tais entendimentos nem de perto se cheiram e que, de guerrilha em guerrilha institucional (e/ou partidária), os respectivos filhotes se alimentam preferencialmente da desavença.
Assobiando então para o ar a propósito das prejudiciais e economicamente injustas convergências nacionais (como se estas passassem ao largo do arquipélago), mobiliza-se então, por exemplo, o PS para a criação de uma Comissão de Acompanhamento ao Rendimento Social de Inserção no Parlamento Regional. Logo o PSD destaca o assunto como de importância prioritária dizendo que o problema se resolve com trabalho comunitário imposto aos beneficiários do RSI (vulgo rendimento mínimo). E ficamos todos a saber que, em termos de tratamento político, o problema social central, não é a concentração da riqueza, não é o desemprego, ou o trabalho precário, ou os salários de miséria. O problema, pelos vistos, é o próprio Rendimento Social de Inserção!
Que conclusão se poderá tirar daqui? Infelizmente nenhuma. Soluções para o desemprego, o trabalho precário ou os baixos salários? Também nenhumas. Mas que há divergências sobre o rendimento mínimo, lá isso há...
Mudando de frente, vemos também o PS desencadear um ataque restritivo e indiscriminado às despesas dos hospitais e da prestação dos cuidados públicos de saúde. Logo o PSD contra-ataca com uma crítica (“profunda”) à política de saúde do Governo Regional, denunciando com especial ênfase…o endividamento exagerado e incontrolado do sector!
Conclusão? Infelizmente nenhuma. Soluções para as carências crescentes no funcionamento do Serviço Regional de Saúde? Também nenhumas. Mas que há divergências na política de saúde, lá isso há...
O Governo diz que a Câmara de Ponta Delgada tem um saldo negativo descontrolado, e logo a Direcção dos Bombeiros de P. Delgada vem a público afirmar que só a Câmara de Ponta Delgada lhes paga a tempo e horas, e cumpre os seus compromissos.
Conclusão? Nenhuma mais uma vez. Soluções para o estrangulamento financeiro que ameaça as autarquias? Igualmente nenhumas. Mas que há divergências, lá isso há...
Enquanto as convergências nacionais enterram o país na recessão, uma pergunta se impõe, portanto: Para que raios servirão (em nome do interesse colectivo, claro) estas divergências regionais tão anunciadas e continuadas?
Para dar pica à vida política, talvez!
E assim divergindo, lá vamos convergindo alegremente...
Artigo de opinião de Mário Abrantes, publicado no jornal "Diário dos Açores", na sua edição do dia 2 de Julho de 2010