Os meus ouvidos captaram e a minha atenção concentrou-se quando as notícias desta semana se referiram repetidamente ao “trambolhão” que os lucros obtidos pelos principais bancos portugueses tinham dado, de 2010 para 2011. Depois, lá vieram os números a fazer tudo regressar à velha ordem: de um lucro de 3 milhões de euros diários em 2010, ficaram-se por enquanto, este ano, por uns míseros 2 milhões...
E a pergunta continua a fazer sentido: Se não têm para o crédito, se precisam de encaixar mais 12 mil milhões, a sacar do empréstimo contraído ao FMI e à UE (fora os avales), para onde vai o dinheiro?
Quando se constata que, paralelamente aos sacrifícios sucessivos e imparáveis, por via dos cortes nos salários e pensões e do aumento dos impostos (aprovando até mais um extraordinário), exigidos àqueles que, pelo esforço do seu trabalho, criam riqueza (ou já a criaram), existem, por outro lado, alguns que a acumulam (isto é, que a tomam para si), registando-se em 2011 um enriquecimento adicional de 18% dos 25 portugueses mais ricos, começamos talvez a levantar a ponta do véu…
Quando se apura que entre Sócrates e Passos Coelho, o Governo da República, em tempo de contenção e de cortes na despesa, resolveu esquecer a contenção e surripiar aos cofres públicos mais de 2 mil milhões de euros para “nacionalizar” os prejuízos atribuídos a burlões do BPN, preparando-se agora para, deitando mão ao mesmo saco, entesourar o dito banco com mais 550 milhões antes da transacção e, mais uma vez do mesmo saco, pagar indemnizações a metade dos seus actuais trabalhadores (de que aqueles que o pretendem comprar por 40 milhões se querem ver livres sem mais encargos), estaremos a aclarar as ideias um pouco mais…
Que ninguém insista é na tecla de que somos todos culpados e responsáveis! Estamos a falar sim de um portentoso esbulho aos cofres do Estado, patrocinado pelos detentores do poder político.
Aquilo que se está passando neste país, começando em Sócrates e continuando com Passos Coelho, a pretexto do pagamento de uma dívida de contornos obscuros, é um ignóbil e anti-constitucional aproveitamento subversivo do poder político e dos seus agentes por parte do poder económico para, como diz o economista Eugénio Rosa, levar por diante, através de medidas patrocinadas pela UE e pelo FMI, uma gigantesca operação de redistribuição do rendimento em benefício dos que mais têm.
Faz todo o sentido, neste contexto, o recurso (subversivo?), utilizado no comunicado recentemente emitido pela Comissão de Justiça e Paz da Diocese de Angra, ao exemplo das duas famílias de composição semelhante que viviam numa ilha, uma com 7000 euros mensais e outra com 500, até que alguém com autoridade, para garantir a sobrevivência de todos, retirou 700 euros à que ganhava mais para os atribuir à outra.
Faz todo o sentido, neste contexto, o recurso (subversivo?), proposto pelo deputado do PCP/A, à pronúncia do Parlamento Regional, antes mesmo da votação final na Assembleia da República, sobre a legitimidade constitucional das verbas cobradas do imposto extraordinário na Região constituírem receita da Região.
Mário Abrantes