Céu limpo em 2015?

mario_abrantesAs estatísticas comprovam ter havido em 2014 menos gente que em 2013 a ouvir a mensagem natalícia do primeiro-ministro português. Correndo o risco de estar publicitar a imagem de quem merece da parte dos portugueses cada vez menor consideração, não poderia todavia, devido ao cargo que o sujeito em causa ainda ocupa, deixar de me referir à sua intervenção no respeitante às perspetivas avançadas para o novo ano que agora se inicia.

E na busca da originalidade, talvez ansiando por não perder audiências, o primeiro-ministro resolveu embrenhar-se pelos meandros da meteorologia revelando, qual versão boletinesca de Nostradamus, que poderemos todos contar com um horizonte para 2015 livre de "nuvens negras"...

Estaria o primeiro-ministro a referir-se à garantia estatística de que a já incomportável dívida pública continuará a subir em 2015? Ou que a troika (Comissão Europeia, BCE e FMI) continua viva e a reafirmar-se no direito de pressionar o País por mais sacrifícios para o novo ano?

Mas previa ainda para 2015 que Portugal entraria numa "nova fase...com cada vez mais confiança no futuro".

Estaria o primeiro-ministro a referir-se à continuidade, garantida pelo OGE, do desinvestimento público na saúde, na educação e na segurança social, da continuidade das privatizações ou da desregulamentação e precarização laboral?

Dizia que no novo ano todos iríamos sentir maior alívio fiscal devido à "reforma do IRS" e à recuperação de rendimentos.

Estaria o primeiro-ministro a referir-se à garantia da entrada em vigor em 2015 dos novos impostos da fiscalidade verde, à subida do imposto sobre os combustíveis, à subida do IMI, ou à subida da electricidade? Ou aos novos contratos emprego-inserção que disfarçam o desemprego e representam salários de miséria financiados com fundos públicos?

E continuava, insinuando que poderemos ficar todos descansados em 2015...desde que "os eleitores não deitem tudo a perder".

Terá esta conversa algo a ver com as preocupações perante as "incertezas internas associadas às eleições legislativas" que manifestou uma semana antes, numa clara escorregadela totalitária de quem convive mal com eleições livres? Tal como aconteceu agora com o FMI e as agências financeiras em relação às eleições antecipadas na Grécia?

Ou o "tudo que os eleitores podem deitar a perder" tem mais a ver (consoante estatísticas recém-publicadas pelo INE) com a evolução da situação em Portugal de 2011 a 2014, sob supervisão da troika, em que esta e o governo cúmplice do primeiro-ministro tiraram 5,8 mil milhões de euros aos salários dos trabalhadores portugueses (6,9% menos) para, sob a forma de dividendos, rendas, lucros ou juros, transferirem mais 4,4 mil milhões de euros (36% mais) para os rendimentos do capital?

Sendo este o caso pois então, para que se dissipem as "nuvens negras" no horizonte de 2015, será necessário que os eleitores dêem um voto de absoluta desconfiança à competência meteorológica do primeiro-ministro e deitem mesmo tudo a perder de forma a ficarmos livres dele, do seu governo, mas também das suas políticas, com e para além da troika...

Os meus sinceros votos dum Feliz Ano Novo tanto para os leitores, como para a direcção e os trabalhadores do Diário dos Açores.

 

Artigo de opinião de Mário Abrantes, publicado em 1 de janeiro de 2015