Participei com todos eles nesse longo caminho de luta que, poucos anos após o 25 de Abril, foi ganhando contornos de luta política democrática contra as políticas de direita que se foram instalando. Foi nesse quadro dinâmico de actividade política transformadora e de luta continuada de resistência, que conheci Álvaro Cunhal e que com ele trabalhei no Comité Central do PCP a partir de 1980, nos Organismos Executivos do Comité Central entre 88 e 92 e no Conselho Nacional entre 92 e 96. O meu relacionamento pessoal e político com Álvaro Cunhal, para além de ser sempre muito cordial e gratificante, assentou permanentemente numa base de total franqueza associada a um permanente rigor na análise dos problemas em apreciação.
Essa proximidade no trabalho político quotidiano permitiu-me, a partir de um conhecimento de maior pormenor, reforçar sempre a enorme admiração que sentia por ele. Participei, com Álvaro Cunhal, em debates e decisões da maior dificuldade e do maior melindre. Percebi nele sempre um permanente respeito pelas diversas opiniões presentes e um enorme esforço em procurar fazer, sempre que possível, as sínteses indispensáveis. Percebi nele uma inquebrantável firmeza nas questões ligadas a princípios e a objectivos estratégicos centrais, mas também aprendi com ele que essa firmeza tem que estar associada a uma capacidade de iniciativa e de acção maleável e muito criativa. Álvaro Cunhal, viveu grande parte da sua vida na clandestinidade, na prisão e no exílio. Talvez por isso notei, no período pós 74 em que o conheci, que ele tinha uma enorme alegria de viver. Quando veio aos Açores em 1984 pela primeira vez, verifiquei, com algum espanto, que tinha vastos conhecimentos de pormenor sobre muitos aspectos da história, da vida económica, da vida social e até da realidade geológica e ambiental do nosso Arquipélago. Aproveitava todos os minutos para acrescentar novos conhecimentos ao muito que já sabia.
Ao longo de todos esses anos sempre se assumiu no interior do PCP como um coerente defensor do Sistema Constitucional da Autonomia consagrado em 1976 na Constituição da República Portuguesa. Sempre apoiou, de forma expressa, a direcção do PCP/Açores nos processos políticos específicos complexos que se desenvolveram. Sempre se interessou pela forma particular e própria como o processo político se desenvolve nesta Região Autónoma. Conviver e trabalhar com Álvaro Cunhal foi certamente um dos maiores privilégios que a vida me possibilitou. Por isso é com emoção que vos peço licença para dizer neste momento: Até sempre, Camarada Álvaro.!
José Decq Mota No “Tribuna das Ilhas” em 17/06/ 05