A semana passada foi tempo da realização do Fórum Económico Mundial, em
Davos, Suíça, e do Fórum Social Mundial, em Caracas, Venezuela.
A localização geográfica das cidades onde se realizaram estes dois
importantes eventos traz-me à memória o discurso de tomada de posse do
novo presidente da Bolívia, Evo Morales.
“(… )A Suíça: um país desenvolvido e sem recursos naturais; a Bolívia com tamanhos recursos naturais e com tamanha pobreza.(…). Depois da constatação do facto o novo presidente boliviano procura os fundamentos que conduziram às profundas assimetrias no desenvolvimento, “(…) Como é possível que desde o ano de 1825 nenhum recurso natural tenha sido industrializado no nosso país? Como é possível que só se tenham exportado matérias primas? Até quando a Bolívia vai ser apenas um país exportador de matérias primas? Como é possível que os nosso governantes nunca tenham pensado no país?(…)
Os fóruns que referimos no início desta coluna representam dois Mundos e dois pensamentos políticos antagónicos. Um mundo e um pensamento político que assenta o sucesso do seu modelo de desenvolvimento na submissão e na exploração de um outro que tem sido espoliado dos seus recursos e, por isso, remetido ao atraso e à pobreza. A riqueza de uns fica a dever-se à miséria de outros. Até quando?
Em Davos reuniram 2 mil participantes - políticos, empresários e “estrelas” do cinema e de outras artes - oriundos de 89 países, em Caracas reuniram-se dezenas de milhares de pessoas vindas de todo o Mundo, políticos, académicos, sindicalistas, dirigentes de movimentos sociais, ambientais e indígenas.
Em Caracas procuraram-se as soluções que possam contribuir para o desenvolvimento harmonioso e sustentável dos povos e, condenou-se a política depredadora e belicista liderada pela administração dos Estados Unidos.
No Fórum Social Mundial de Caracas esteve em causa a necessidade de encontrar caminhos para a evitar a auto destruição do planeta e a responsabilidade, de todos, para salvar a nossa casa comum lutando contra um modelo económico ilógico, inviável e, sobretudo, desumano.
Em Davos o debate foi em torno da criatividade. Criatividade em aumentar a rentabilidade e a produtividade à custa do esvaziamento dos direitos sociais e do papel do estado.
Em Caracas alguém disse: “Os grandes problemas mundiais podiam começar a solucionar-se, se: - Os Estados Unidos declarassem a paz no mundo e em Davos se declarasse o fim da miséria.”
Mas nem os Estados Unidos mostram sinais de querer trilhar os caminhos da paz e muito menos Davos deu mostras de querer por fim aos desequilíbrios económicos e sociais.
Com os seus sucessos e insucessos o movimento gerado pelo Fórum Social Mundial congrega milhares de milhões pessoas à volta de um objectivo comum: a humanidade e o planeta que habita.
Um dos participantes no Fórum de Davos foi Bill Gates que depois se deslocou a Portugal onde foi agraciado com uma condecoração pelo Presidente da República. A condecoração foi atribuída a este ilustre cidadão pelas ajudas humanitárias aos PALOP e insere-se na habitual onda condecorações que caracteriza o final dos mandatos presidenciais.
A decisão do Presidente da República não está em causa. O Dr. Jorge Sampaio condecora quem quer.
O patrão da empresa que domina o mercado mundial da informática tem, de facto, contribuído com donativos e programas de ajuda aos países subdesenvolvidos e em vias de desenvolvimento, nem outra coisa seria de esperar mas, há sempre um mas nestas coisas das esmolas.
Será que as ajudas não se destinam, por um lado a perpetuar os níveis de desenvolvimento e, por outro lado a aumentar a quota de mercado do império de Bill Gates?
Isto faz-me lembrar o Rendimento Social de Inserção que todos temos consciência de que, sendo uma medida importante, não resolve o essencial. Ou seja, mais importante que a ajuda financeira é a disponibilização dos meios e dos instrumentos para que os indivíduos possam, de modo próprio, aceder a rendimento que lhes permita estar inseridos socialmente.
Quando a esmola é grande o pobre desconfia.
Ponta Delgada, 02 de Fevereiro de 2006
Aníbal C. Pires