No entanto, à medida que se vai aproximando o fim do seu mandato emergiu no espaço público regional uma velha discussão que, ao invés de centrar a discussão no essencial coloca-a ao nível do acessório, senão mesmo do folclore político regional. Deve, ou não, o Representante da Republica para os Açores ser um filho, natural, destas ilhas? Eis a questão…que levantou da poeira do esquecimento velhos tabus. Nas últimas semanas vários comentadores e politólogos têm, com toda a legitimidade, emitido opinião e aventado vários nomes, naturalmente de açorianos filhos da terra, como as personalidades mais indicadas para o exercício do cargo. Mas, uma vez mais centrar a discussão na naturalidade de quem deve, ou não, ser o próximo Representante da República na Região pondo como condição de partida que o lugar deve ser ocupado por um açoriano, parece-me, para além de redutor, de um regionalismo bacoco e, no actual contexto político, completamente descabido.
A competência técnica, a independência político partidária e, sobretudo, a compreensão desta forma especial de organização do estado, o que a motivou e a sustenta devem ser, esses sim, os critérios objectivos que devem presidir à indicação da personalidade que vier a substituir o Dr. Laborinho Lúcio e, não a subjectividade de uma escolha condicionada pelo dogma de que um bom Representante da República para os Açores só o será se for açoriano de nascimento. A personalidade que actualmente exerce o cargo e que será, por via da última revisão constitucional o último Ministro da República para os Açores, teve um desempenho que, pensei eu, teria afastado definitivamente, para o arquivo da história, esgotadas estratégias políticas. A lisura e rigor que caracterizam o mandato exercido pelo Dr. Laborinho Lúcio seriam, por si só, suficientes para derrubar a tese de que: – Bom! Só se for açoriano. Mas o Ministro da República que brevemente cessa funções foi para além da lisura e do rigor, o Dr. Laborinho Lúcio assumiu-se como um actor político interventivo, demonstrou um profundo conhecimento da realidade política, económica, social e cultural da Região, dignificou o cargo e, sobretudo, foi um defensor dos interesses da Região junto da República e não o contrário.
Difícil será encontrar uma personalidade que o substitua, independentemente, de onde tenha nascido. O contínuo e crescente esvaziamento dos poderes do executivo regional com a transferência de competências para sociedade gestoras, sejam elas dos portos, da coesão, da saúde ou do ambiente e a incompreensível manutenção das competências legislativas da Região numa lamentável indefinição, pelo atraso na revisão do Estatuto Político e Administrativo, constituem factos políticos, estes sim, de grande relevância para a discussão sobre os caminhos da autonomia. A última revisão constitucional transferiu amplas competências para a Região dando, assim, resposta a velhas reivindicações regionais. Paradoxalmente a atitude do órgão a quem cabe tomar a iniciativa de promover a apresentação de uma proposta de revisão do Estatuto Político da Região, que permita a assunção plena das novas competências legislativas, pauta-se pela inércia.
Quem vai ser o próximo Representante da República e se vai ser, ou não, um açoriano não é relevante e, os caminhos a percorrer pela autonomia regional não dependem, em bom rigor, desse facto. Já a zona cinzenta de dúvidas sobre as competências legislativas da Assembleia Regional, que não há meio de tender para a clarificação, e a propensão que os actos do executivo de Carlos César têm para se limitar a avales concedidos às sociedades gestoras que, entretanto foi criando, são bem mais importantes, ou melhor, determinantes para o futuro da autonomia constitucional.
Aníbal C. Pires, IN Açoriano Oriental, 10/02/2006