A eleição do candidato apoiado pela direita fica a dever-se a alguns factores, uns mais tangíveis que outros, dos quais destacamos os seguintes: - flutuação de parte do eleitorado que viu no voto em Cavaco Silva a possibilidade de penalizar as políticas e o incumprimento de promessas eleitorais do PS de José Sócrates; - a bem sucedida campanha de branqueamento do passado político de Cavaco Silva e a subsequente construção de uma nova imagem, despida de responsabilidades na crise económica, financeira, social, política e ética que Portugal vive; - a abordagem e estratégia adoptada pelo PS no que a este importante acto eleitoral diz respeito. Terá sido, porventura, este último factor que mais decisivamente contribuiu para a vitória de Cavaco Silva. O “timing” da apresentação do candidato oficial do PS e a posterior emergência do seu seio de uma segunda candidatura tiveram como consequências a divisão do PS e a desmobilização dos seus militantes e simpatizantes.
A notória capitulação da direcção do PS perante a candidatura apoiada pelo PSD e pelo CDS/PP e a manifesta incapacidade na gestão interna teve como consequência directa a eleição, pela primeira vez depois da Revolução de Abril, de um candidato presidencial oriundo da direita. A vitória de Cavaco Silva fica a dever-se, não à divisão da esquerda como alguns sustentam, mas ao facto de o PS se apresentar dividido e com algumas histórias por explicar. A vitória do candidato da direita traduz-se, no essencial, na derrota do PS de José Sócrates e na derrota dos que alimentaram, falaciosamente, a desconfiança contra a política e os políticos tendo a consciência que nem todos os políticos e políticas são iguais e que uma expressão plena da cidadania é, exactamente, a participação partidária. Quer a estratégia de Sócrates quer a candidatura corporizada por Manuel Alegre foram, pela sua forma, capitalizadas a favor de Cavaco Silva.
A mobilização de eleitores, o enriquecimento do espaço público nacional e a expressão eleitoral obtida vieram confirmar a importância da candidatura de Jerónimo de Sousa na luta por uma ruptura democrática com a política de direita e na construção de uma alternativa de esquerda para Portugal. O resultado eleitoral da candidatura de Jerónimo de Sousa nos Açores ficando aquém da média nacional é, no entanto, positiva se comparada com os resultados obtidos pelo candidato apoiado pelo PCP nas eleições presidenciais de 2001 e com a votação na CDU em Fevereiro de 2005. A expressão eleitoral de Jerónimo de Sousa anima a luta dos comunistas açorianos para que, também nos Açores, se caminhe para a construção de uma sociedade mais democrática nas vertentes política, económica, social e cultural e, por certo, contribuirá para a sentida necessidade política de o PCP Açores retomar a sua representação institucional os órgãos de governo próprio da Região. A candidatura de Cavaco Silva ao obter, na Região, um valor acima da média nacional traduz, por um lado a desmobilização e rendição do PS Açores, à imagem do resto do país, face à candidatura da direita e, por outro lado a eficácia da campanha de branqueamento do passado político do presidente eleito, nomeadamente, no que ao relacionamento com os Açores diz respeito; campanha que nos Açores contou com o apoio incondicional de quem trocou a defesa da autonomia regional por valores bem mais regressivos.
Não sendo a Presidência da República um órgão executivo não é, no entanto, indiferente para os destinos do país quem a assume e, sobretudo, os interesses que representa. O recém eleito Presidente da República, por quem é e pelos interesses que representa, vai, não só dar o seu aval à política de destruição e privatização dos sectores sociais do estado, mas também abrir caminho à descaracterização da Constituição da República liquidando o que ainda lhe resta das importantes conquistas democráticas da revolução de Abril. A eleição de Cavaco Silva vem, assim, exigir mais empenhamento de todos na luta pela ruptura democrática e de esquerda com as políticas que nos conduziram à crise. Políticas nas quais o Presidente eleito se revê e, a crise para a qual contribuiu com 10 anos, em 30, no exercício da função de primeiro-ministro, durante os quais desbaratou enormes recursos financeiros que se destinavam à modernização da economia nacional e à qualificação dos recursos humanos. O novo quadro político, decorrente da eleição de Cavaco Silva, não é substancialmente diferente do que vivíamos apenas se tornou mais exigente e complexo na mobilização em torno da construção de uma alternativa de esquerda e na contestação social às actuais políticas de direita que atentam contra a dignidade humana, devastam, irracionalmente, os recursos naturais e promovem a conflitualidade entre estados soberanos.
Ponta Delgada, 01 de Fevereiro de 2006 O Coordenador Regional, Aníbal C. Pires