Tudo sobre rodas…

mario_abrantes.jpgPor cá, como estava previsto, mesmo com um recorde nacional de 23% de ausência de turistas (afinal apenas nos livrámos dos suecos que até por acaso, como se dizia, nem deixavam cá nada…), o Casino avança de qualquer maneira, pois que se trata de uma questão de “UTILIDADE PÚBLICA URGENTE”.
A EDA (enquanto empresa de capital maioritariamente público) gastou muito dinheiro a adquirir património, para agora o mesmo ser vendido à ASTA, por expropriação decretada pelo Governo (mesmo que a ASTA não tenha dinheiro, o Governo avança), a preços que certamente não serão os 6 milhões que a EDA pede, já que a ASTA se oferece para dar apenas 1 milhão… Tudo dentro da Lei, claro! Mas há mais…Como a ASTA é um “testa de ferro”, por trás dela alguém terá de avançar, e pelos vistos já se abriram as portas aos Espanhóis para explorar o Casino e aos Irlandeses para participarem no seu capital, via Verdegolfe (como se sabe, esta também já deixou de estar por conta da Região). Conclusão: em nome do interesse público entrega-se a preço confortável o lucro do jogo a interesses privados e, ainda por cima, estrangeiros…Tudo dentro da Lei, claro! Uma Lei (alguém a fez) que nos permite contratar um cozinheiro de primeira para poder rapar o tacho, e ficarmos todos felizes com isso… Aliás, se verificarmos o que se passa a nível nacional com as OPAS, constatamos que simplesmente mais riqueza não há, já que é apenas o capital de uns que passa (e se concentra) na mão de outros.
 
No caso da PT, o “testa de ferro” é um português (o tal que em tempos ameaçou passar todos os seus negócios para fora do País) a trabalhar para os franceses para a extorquir dos espanhóis… E com estes movimentos o Primeiro-ministro, compartilhando do estímulo que a eleição de Cavaco imprimiu à coragem dos grandes grupos económicos para interferir decisivamente na política, exulta e diz que a esperança renasce, em consonância com aqueles e os seus ideólogos. Dessa santa congregação tivemos uma excelente amostra no “Prós e contras” da TV, com todos a uma só voz: o Ministro da Presidência, o patrão do Grupo Amorim, o Proença de Carvalho, o Sarsfield Cabral e um Deputado do PSD (este até provocou na assistência uma gargalhada geral quando, apesar de reconhecer concordâncias, disse que defendia políticas diferentes das do Governo de Sócrates…). Apenas uma voz incómoda de quando em vez se ouvia (coisa que raramente acontece entre os convidados do programa em questão).
 
Era a de Carlos Carvalhas a escangalhar o idílico arranjinho e a demonstrar que a cenoura com que acenavam ao Zé Povinho estava podre. Teve foi que falar depressa porque a grande fatia do tempo, como disse a apresentadora, tinha de ser para o Ministro Pedro Silva Pereira… Temos então de voltar a França e verificar que nem tudo é garantido que corra sobre rodas àqueles que falam a uma só voz e acenam com cenouras podres ao Zé Povinho para lhe impingir as tais “reformas profundas”, de cuja necessidade falam, mas que, por impossibilidade objectiva, nunca explicam claramente como podem ser do interesse do burro. A tentativa de liberalização dos despedimentos “imprescindível para a economia”(?) está a trazer para as ruas de Paris estudantes e trabalhadores em tal número e com uma tal força que, ao Governo Francês, só resta agora parar para concertar as rodas sobre as quais alegremente deslizava.
 
Mário Abrantes, In Jornal dos Açores, Ponta Delgada, 16 de Março de 2006