Processo de Bolonha (1)

anibal_pires.jpgA exígua discussão pública à volta da reforma do ensino superior no espaço europeu, vulgo Processo de Bolonha, tem-se limitado à enfatização e promoção de alguns aspectos que aparentemente, só aparentemente, são as vantagens e virtualidades deste processo.
“A minha alma espanta-se” com a ligeireza que a comunidade académica, os jovens estudantes candidatos ao ensino superior e as famílias aceitam, sem a necessária discussão participada que se clarifiquem objectivos e consequências futuras que advirão da implementação do Processo de Bolonha. A uniformização, através da comparação por um sistema de créditos, que visa a mobilidade dos estudantes entre universidades no espaço europeu, a criação de 3 ciclos de estudos superiores e a diminuição do tempo para a aquisição de graus académicos correspondentes, constituem, quiçá, os aspectos mais conhecidos da reforma que o Processo de Bolonha propõe para o ensino superior nos países que o subscreveram ou venham a subscrever.
 
Partindo deste pressuposto, ou seja, de que estes são os aspectos mais conhecidos da generalidade dos cidadãos é sobre eles que aqui expresso a minha opinião e algumas interrogações não, sem antes deixar alguns dados sobre o evoluir do processo e os interesses que, não estando enunciados, lhe estão subjacentes. Em 1998, Sorbonne, os ministros do ensino superior de Itália, França, Alemanha e Inglaterra subscreveram uma declaração conjunta que inicia formalmente o processo. Em 1999, Bolonha, um conjunto mais alargado de países, de entre os quais Portugal representado pelo então ministro Marçal Grilo, concordaram e subscreveram a criação de uma Área Europeia de Ensino Superior. Em 2001, Praga, realizou-se a primeira conferência de acompanhamento foram reafirmados os compromissos assumidos anteriormente, nomeadamente, a implementação, até 2010, da Área Europeia de Ensino Superior. Em 2003, Berlim, nova conferência de acompanhamento, nesta altura já 37 países tinham declarado a sua adesão, são definidas prioridades e fixados novos objectivos. Em 2005, Bergen, nova conferência ministerial de acompanhamento; incorporação no processo de algumas das conclusões do Conselho Europeu de Lisboa, 2000, e de Barcelona, 2002. Agendada nova conferência ministerial para 2007, em Londres.
 
A criação de uma Área Europeia de Ensino Superior e os objectivos vertidos no texto de Bolonha que enunciam a importância do desenvolvimento coerente e coeso do Ensino Superior nos países que subscreveram ou vierem a subscrever a declaração de Bolonha podem ser considerados, por si só, como positivos. Sendo este processo iniciado e patrocinado pelos países que dominam política e economicamente a União Europeia e as sua área geográfica de influência e, sabendo-se qual a visão e o papel que o modelo neoliberal tem e reserva para a educação importa, por isso, analisar com maior profundidade estes objectivos, aparentemente, inócuos e anunciados como um imenso oceano de oportunidades e como um progresso (revolução) a caminho de um ensino superior onde o reconhecimento da formação adquirida possibilite e facilite a mobilidade dos estudantes na denominada Área Europeia de Ensino Superior. Na próxima semana darei continuidade a esta temática.
 
Aníbal Pires, In Expresso das Nove, Ponta Delgada, 07 de Abril de 2006