Comemorar é recordar a imensa alegria que transbordou do coração das mães portuguesas e as lágrimas com que abraçaram os filhos certas de que nada, nem ninguém, jamais, lhes adiaria o futuro. Comemorar Abril é celebrar a Revolução que libertou Portugal da ditadura que fez desta terra uma pátria madrasta. Comemorar Abril é, sobretudo, resistir e lutar. É resistir à ideia da inevitabilidade de uma política que para ser bem sucedida produz desemprego, exclusão social e pobreza, uma política que gera injustiças sociais e económicas, uma política que acentua assimetrias no desenvolvimento regional, nacional e mundial. É lutar contra o domínio escravizante do consumismo, é lutar contra a mercantilização das ideias, da educação e da informação, é lutar contra quem nos quer despojar dos direitos inerentes à própria condição humana. Comemorar Abril e Maio é, também, defender os princípios que a Revolução consagrou na Constituição da República Portuguesa (CRP) que, apesar de sucessivas revisões, se mantém como um dos textos constitucionais mais avançados da Europa.
A defesa da CRP e a exigência do cumprimento das normas mais progressistas que ela encerra e, que há muito aguardam concretização devem constituir-se como uma das principais batalhas do povo português no actual contexto político nacional. As sucessivas revisões da CRP foram introduzindo alguns aspectos negativos como, por exemplo, a permissão da transferência de poderes para a União Europeia, a aceitação da jurisdição do Tribunal Penal Internacional, a extradição de cidadãos portugueses, a subordinação da legislação nacional à europeia e que representam graves atentados à soberania nacional. No entanto a CRP permanece, apesar dos enunciados e de outros aspectos negativos, um texto de referência e de conteúdo progressista. Talvez, por isso o texto constitucional continue a ser alvo de ataques por sectores políticos e económicos que defendem e apoiam as políticas que conduziram Portugal ao estado deprimido em que actualmente se encontra, que os indicadores estatísticos demonstram e, que a vida diariamente nos confirma. Comemorar Abril em Maio dos trabalhadores e do sonho que será o futuro é não desistir, é resistir, é lutar pela paz, contra a fome, pelo desenvolvimento humano, pela educação e cultura, pelo trabalho com direitos. Comemorar Abril e Maio é lutar por um Portugal com futuro e pelo sonho – um outro Mundo melhor é possível – que será futuro.
Aníbal Pires, In Atlântida, Ponta Delgada, 01 de Maio de 2006