A greve de hoje, abafada quanto baste pela informação nacional e regional, teve honras de 1ª página num prestigiado jornal inglês: “The Guardian”.
O jornal publicou terça-feira na sua edição online uma reportagem em que fez, ao contrário da generalidade da imprensa nacional e regional, um retrato realista do estado atual de Portugal, considerando que no fundamental as medidas de austeridade não têm servido senão para conduzir o país à recessão, ao empobrecimento e ao “sofrimento” dos portugueses, incluindo ao “aumento da mortalidade” (referido no próprio título da notícia)…
E no seguimento o INEstatística veio agora constatar que a realidade do país é precisamente o inverso dos anunciados objetivos que o governo de Passos Coelho sempre tem afirmado pretender alcançar com as suas medidas de austeridade, ou seja, a despesa pública (afinal) aumenta e as receitas do Estado (afinal) diminuem significativamente, refletindo (digo eu agora) um país em desgoverno e a caminho do abismo.
Foi o próprio governo PSD/CDS que admitiu esta semana estar a verificar-se o recurso imparável às falências fraudulentas e à generalização do não pagamento (ilegal) das indemnizações devidas por despedimento.
O mesmo governo que, no entanto e de forma aparentemente cega e irracional, mas efetivamente sempre se colocando do lado contrário ao dos trabalhadores e desempregados, vem depois anunciar que o combate ao desemprego se deve fazer sobretudo…com incentivos às empresas e ao empreendedorismo, isto é, medidas indiretas sem quaisquer objetivos sociais mensuráveis ou controláveis, mas que favorecem (e abonam) em particular os mesmos que provocam as falências fraudulentas e os despedimentos!
No mesmo sentido, através da sua retirada sucessiva, legal, ilegal ou simplesmente por via do facto consumado, está assim criado por todo o país, por iniciativa do governo PSD/CDS, e com o apoio troikista do PS, o vazio dos direitos laborais, restando a lei da selva em que apenas uma parte mais esclarecida e empenhada na defesa dos interesses coletivos dos trabalhadores, descortina ainda quais os direitos que lhes assistem, quais desses direitos ainda subsistem, e por quais se dispõem a lutar. Àqueles outros, momentaneamente engolidos sem resistência e sem luta, pela vaga envolvente dos despedimentos, do roubo dos salários e da desproteção social, os serventuários nacionais e regionais da Troika, vão-lhes reservando o desnorte, a depressão, o medo, a instabilidade pessoal e familiar, a pobreza e mesmo a fome...quando não a própria antecipação da morte.
É neste quadro, de perfeita distorção e mesmo ocultação generalizada e deliberada dos valores e regras do trabalho e do emprego e da sua justa remuneração, que o governo pretende legalizar (a partir do próximo dia 28 do corrente na Assembleia da República), com a manifesta paternidade das centrais patronais e financeiras do país e da Europa da Troika, o pacote da maior extorsão de sempre, desde o 25 de abril, de direitos, rendimentos e proteção social aos trabalhadores, estejam estes empregados ou desempregados, trabalhem na função pública ou no setor privado, sejam efetivos, contratados ou precários, estejam no ativo ou na reforma.
O Jornal inglês, na mesma notícia, entrevistava uma historiadora, Irene Pimentel, a qual assegurava que o povo português não iria continuar passivo perante tanta injustiça…Pois precisamente por isso, e contra a passividade que nos pretendem impingir, HOJE É DIA DE GREVE!
Artigo de opinião de Mário Abrantes, publicado em 22 de março de 2012