G8 – Os mesmos objectivos estratégicos

jos_decq_mota_webReuniram-se a semana passada, em Camp David, EUA, os representantes dos oito países mais industrializados do Mundo (Estados Unidos, Reino Unido, Alemanha, França, Itália, Japão, Canadá, Rússia), para, tal como é feito desde 1975, avaliarem a situação mundial, especialmente no que toca aos resultados da globalização em curso. Estes países representam 51% do PIB mundial, mas não são os oito “mais ricos” como é quase sempre dito, pois são vários os países que têm economias maiores do que alguns que estão neste clube, como são os casos da China, India e Brasil.
A presente cimeira G8 é feita num momento em que a Europa vive uma crise económica e financeira profunda, estando em causa, para muitos, o euro e a própria existência da UE enquanto associação livre de estados soberanos.
A presente cimeira G8, que foi especialmente organizada pelo Presidente Obama, é feita em ano de eleições presidenciais americanas, no termo de um mandato em que a economia americana estagnou e enfrenta fortíssimas dificuldades.
Na presente cimeira G8, participaram uns EUA com sérias dificuldades económicas e financeiras; um Reino Unido sempre “europeu” e sempre “antieuropeu”; uma Alemanha que controla totalmente o euro e a economia europeia; uma França que parece não querer continuar a ser o “cúmplice” assumido do domínio económico alemão; uma Itália que emite a imagem da “ricaça cheia de dívidas”; um Canadá que vai sabendo viver a tirar partido da proximidade dos EUA e dos laços económicos com o Reino Unido; um Japão cheio de feridas que resultam, quer das catástrofes naturais, quer das catástrofes geradas pela ansia desenfreada de crescer; uma Rússia onde o capitalismo selvagem, controlado por grupos sem escrúpulos, é uma realidade triste e perigosa.
Para além dos Chefes de Governo desses países estiveram presentes nesta cimeira os Presidentes do Conselho e da Comissão da União Europeia, certamente para criar a imagem, que não corresponde à realidade, de que as instituições Europeias têm poder de decisão estratégica.
Esta foi uma cimeira entre os principais responsáveis de uma situação, que eles próprios já não controlam em grande parte.
Os objectivos de curto prazo da Cimeira do G8 parecem-me claros. Por um lado tentaram encontrar um quadro mais “pragmático” que possa travar a marcha da zona euro para o “abismo”, sem pôr em causa a ideologia neoliberal dominadora; por outro lado procuraram ajudar a reforçar as possibilidades de reeleição de Obama, cujo mandato é marcado por um enorme somatório de desilusões sentidas por milhões dos seus eleitores de há quatro anos.
Do ponto de vista estratégico, a Cimeira do G8 nada acrescentou de novo. Continuaremos a viver num quadro dominado pelo grande poder financeiro especulativo, que tem como objectivo actual a acentuação da exploração e uma inaudita concentração da riqueza criada pelos Povos.
O domínio económico claro que a Alemanha exerce sobre quase todos os Países da União Europeia serve, na Europa, este objectivo dominador do grande capital financeiro internacional, na medida em que cria a base que “justifica” as tão faladas reformas estruturais que se resumem a liberalizar as relações de trabalho, diminuir a remuneração global do trabalho, reduzir muito os serviços públicos nas áreas da saúde, educação, segurança social e outras, transformando direitos e serviços sociais em áreas de negócio. Com estes objectivos pretende-se liquidar as conquistas sociais alcançadas, pretende-se explorar e dominar mais e mais.
Este novo extremismo, que se desenvolve à sombra de uma globalização redutora do papel dos Povos, vai esvaziando perigosamente a democracia, reduzindo a democracia política a rituais que pouco ou nada têm a ver com as opções que se tomam no exercício do poder. Quem tudo determina é um decisor único, exterior às Nações e aos Estados.
O que se está a passar na Grécia é a manifestação de resistência de um Povo milenar e demonstra que é possível e é indispensável resistir.
A manutenção do essencial da ideologia neoliberal, atenuada com a proclamação de intenções de desenvolvimento, como parece ser a posição dos socialistas, de nada nos serve, pois deixa-nos completamente à mercê da especulação financeira já feita e a fazer.  
Temos agora em Portugal a “troika”, ou seja os rostos desta invasão sem tropas que o nosso País está a enfrentar. Veem fazer a 4ª avaliação da execução do memorando de entendimento e certamente não se esquecerão de observar o empobrecimento do País, os resultados da recessão, o crescimento do desemprego e irão dizer que Portugal está a cumprir bem, pois os objectivos deste programa são exactamente esses.
Este caminho neoliberal extremista está a transformar a União Europeia numa caricatura de Associação de Estados, controlada exactamente por aqueles que perderam as duas guerras do séc. XX, com as quais pretendiam obter o domínio que hoje já têm em boa parte. O grande capital financeiro internacional aplaude.
Os líderes do G8 falam de “crescimento”, mas com “as reformas estruturais em marcha". O grande capital financeiro internacional volta a aplaudir.
O novo Presidente da França fala de novo rumo e repete o discurso do “crescimento”. O presidente do PS português propõe uma adenda ao tratado orçamental que aprovou sem adenda nenhuma, pretendendo criar a imagem que “esse é o novo rumo”. Se assim for o grande capital internacional aplaudirá uma vez mais.
Depois da eleição de Hollande como Presidente da França esboçam-se “dois campos”: Os que defendem “a austeridade” e os que defendem “a austeridade com crescimento”. O que une estes dois campos são as “reformas estruturais”, que ambos defendem. Trata-se da mesma ideologia, transformada em política concreta, apenas com ritmos diferenciados.
É para mim claro que nesta cimeira do G8 ninguém defendeu, com clareza, uma nova estratégia que retire poder e capacidade especulativa ao grande capital financeiro internacional.
Cada vez me convenço mais que só a acção dos Povos irá pôr termo à brutal situação que o poder financeiro internacional, associado à economia paralela e ilegal, está a impor. Pouco há a esperar dos actuais dirigentes políticos da maior parte dos chamados países ricos, porque estão minados pela ideologia neoliberal, à qual deram força e estão enredados em teias de interesses de classe e grupo.
O G8 já teve muito poder. Hoje o G8, tal como a maioria dos Governos, está subjugado e alinhado com o “poder invisível" que criou.

Artigo de opinião de José Decq Mota, publicado em 26 de Maio de 2012