Desobediência civil?

mario_abrantesO mesmo governo de Coelho/Relvas e os deputados da maioria PSD/CDS (incluindo para nossa vergonha os deputados do PSD eleitos pelos Açores para a Assembleia da República) que pretendem pôr em prática um ilegítimo e por todos contestado processo de extinção (a que chamam de "fusão") de freguesias em todo o território português, sob o pretexto de reduzir despesas com a administração local, pretendem agora aprovar uma proposta de lei em que criam mais de cem novos cargos dirigentes, todos remunerados (com montantes semelhantes aos dos executivos das Câmaras Municipais) a que chamam de Comissões Executivas Metropolitanas ou Intermunicipais para albergar em novos tachos muitos dos compinchas partidários que, por terem chegado ao limite dos mandatos, não se poderão candidatar novamente às Câmaras em 2013...

Se, pelo caráter iníquo da lei, já se justificava plenamente a instauração de processos jurídicos contra a extinção por decreto, as petições, os eventuais boicotes e mesmo a desobediência civil como armas recorrentes de muitas freguesias para continuar a existir, muito maior força de razão e legitimidade moral e política lhes advém agora para esses atos, incluindo o da desobediência...

E 700 propostas de alteração à aplicação da lei PSD/CDS de extinção, apresentadas pelo PCP na Assembleia da República, com vista a impedir precisamente o desaparecimento por decreto de 700 freguesias, não constitui propriamente uma ato de desobediência civil, mas constitui sem dúvida um ato político e cívico da maior relevância e oportunidade para obrigar a que, na discussão na especialidade de cada uma das ditas "agregações de freguesias" decretadas, se processe uma votação própria por separado, forçando a que os deputados da maioria PSD/CDS se retratem individualmente perante os seus eleitores em cada uma das freguesias a extinguir, por um lado, ou, se a maioria pretender votar tudo em conjunto, que a aplicação da lei se torne inconstitucional por esse facto.

Nos Açores o processo será forçosamente diferente porque a Autonomia assim o exige, e como afirmou o delegado regional da ANAFRE, se a maioria PSD/CDS insistir na aplicação da lei de extinção a estas ilhas, ela deverá seguir de imediato para a barra dos tribunais. Isto se, tal como foi solicitado, o veredito do Tribunal Constitucional não tiver já entretanto decretado a nulidade da sua aplicação aos Açores.

Mas sobretudo a oposição mais determinante, e sem necessitar de recorrer à desobediência civil, deverá vir da Assembleia Legislativa da RAA, e porquê? Porque a ela é que compete, nas Regiões Autónomas, decidir sobre a extinção ou constituição de freguesias e, no seu mandato anterior, a Assembleia pronunciou-se unanimemente sobre este assunto:

Diz o ponto 8, a páginas 120, do relatório sobre a Reforma da Administração Local, aprovado por unanimidade na Assembleia Legislativa da RAA, que: "A atual organização territorial autárquica das freguesias existente nos Açores revela-se adequada à realidade política, social, económica e cultural do nosso Arquipélago, constituindo um importante instrumento de dinamização do desenvolvimento e da coesão de cada uma das nove ilhas dos Açores e, consequentemente, da Região no seu todo".

Com o sincero desejo que nenhum dos atuais deputados do parlamento açoriano, ao contrário do que outros fizeram na Assembleia da República, volte com a palavra atrás, são, quanto a esta resolução e atendendo à época que atravessamos, os meus votos de bom Natal...

 

Artigo de opinião de Mário Abrantes, publicado em 19/12/2012