Será admissível?

mario_abrantesSalvo eventualmente o turismo, a agro-pecuária e pequenas empresas que exploram nichos de mercado interno e externo, os serviços e o investimento público têm sido o fator determinante para o desenvolvimento e a fixação de ativos nas 6 ilhas que na última semana foram notícia (para já não falar em muitas parcelas do território das restantes) pela perda de residentes entre os censos de 2001 e 2011.

Ora o turismo, apesar do que se tem investido na sua promoção, regista recuos sucessivos, e do pouco que tem contribuído até à data para o produto interno não se vislumbram melhoras próximas dada a incontrolável retração do mercado externo. A agropecuária, apesar de se manter produtiva e geradora de riqueza, encontra-se em fase de estabilização do seu crescimento. O investimento público, pilar insubstituível e essencial para a sustentabilidade de um território arquipelágico, distante e de já fraca densidade populacional como o nosso, tem vindo a reduzir-se aceleradamente nos últimos anos.

Assim, em dez anos (2001/2011) 6 ilhas emagrecem em população residente, havendo concelhos onde o valor dessa redução chegou quase aos 10%, isto é, uma perda de 1% ao ano. O leitor já imaginou certamente que a manter-se um tal ritmo de desertificação, não serão só as pessoas que desaparecerão. Com elas, serão os Açores e Portugal a descaracterizarem-se, respetivamente, enquanto Região e enquanto Nação e Estado Democrático.

O que evitou que isso acontecesse até agora, após a Revolução de 25 de Abril de 1974 que estancou a desertificação e acabou com as “ilhas adjacentes”, foi a institucionalização da Autonomia Político-Administrativa dos Açores e o seu suporte financeiro mutuamente acordado entre o Estado Democrático e a Região: A atual Lei de Finanças Regionais.

Torna-se assim muito difícil de compreender que o autor (mancomunado com os seus capangas no país e no FMI) da invenção de que a seguir à troika e a 2013 têm de vir mais 4 mil milhões de cortes na função pública e nas funções sociais do Estado, para o “refundar”, e da imposição declarada e unilateral de uma revisão da Lei de Finanças Regionais que limita e controla fortemente o investimento público e se propõe “refundar” também a Autonomia nos Açores, tenha sido no passado fim-de-semana recebido de pé e com aplausos (com honrosas exceções) por muitos delegados do congresso dum partido regional que insiste até à exaustão em afirmar-se como o campeão da Autonomia, e que tenha sido publicamente saudado e elogiado pela sua “coragem, para romper com o passado”, pelo novo líder regional desse partido…

Bem sabemos das reticências à revisão daquela Lei depois colocadas pelo líder do PSD-A e da promessa que os deputados do PSD na AR eleitos pelos Açores votarão contra ela, tal como agora se apresenta (a memória recente do que se passou com os mesmos deputados sobre a votação do Orçamento de Estado para 2013, deixa infelizmente algumas reservas…)

Bem sabemos também que o anterior Governo do PS nos Açores se acomodou de forma pouco dignificante à imposição da redução de 30 para 20% do máximo do diferencial fiscal para a Região…

Será admissível e aceitável que a Autonomia dos Açores, para desgraça dos açorianos, caminhe desta forma para se converter, tal como Portugal, para desgraça dos portugueses, numa simples bandeira de usar à lapela?

 

Artigo de opinião de Mário Abrantes, publicado em 16 de janeiro de 2013