O autoritarismo político está de regresso, sob outras formas e noutras circunstâncias é certo, mas após um interregno de 39 anos aí está ele a insinuar-se em todas as frentes. Antes o fascismo tinha os interesses da “Pátria” como pretexto, agora o novo candidato ao exercício do poder absolutista tem os interesses do “País” como pretexto.
Prova direta disso é o comportamento revanchista e intolerável do governo perante a manifestação popular organizada pela CGTP-In para o próximo sábado e que incluía a travessia da Ponte 25 de Abril. Todas as razões de segurança invocadas para impor a proibição da travessia da ponte, nunca o foram antes para as dezenas de maratonas com milhares e milhares de participantes que já fizeram esse percurso ao longo de anos.
Prova direta disso é, após mais um falhanço das metas para 2013, a imposição de um orçamento para 2014 contendo mais austeridade ainda que o do ano corrente, composto por medidas restritivas soltas e elaboradas em cima do joelho, debitadas sobre os portugueses às pinguinhas (para baralhar a soma) antes da sua apresentação oficial, sem qualquer ponta de respeito por eles nem pelo seu futuro colectivo e onde apenas beneficiam de facto as muito grandes empresas (por via do anúncio da baixa do IRC), mas se consagram por tempo indeterminado, e sem definição de objetivos, os cortes nos salários, pensões e outros rendimentos e o empobrecimento da esmagadora maioria dos cidadãos.
Prova direta disso é o governo, com o apoio do PR, que jurou cumprir a Constituição antes de tomar posse dos cargos, falar em nome do “País” para contrariar a sua Lei Fundamental e, face às acrescentadas medidas restritivas que pretende fazer aprovar, formular novas ameaças ao Tribunal Constitucional, apoiado sem pudor por mais uma onda de declarações públicas de intromissão internacional, do FMI e outras entidades europeias, pressionando ilegitimamente e sem vergonha a República Portuguesa e a sua Constituição.
“Não é preciso alterar a Constituição, para implementar as reformas necessárias ao País…”(Passos Coelho). Mas nunca um governo atacou tanto a Constituição e as outras instituições de poder, num Estado de Direito e numa República Democrática. É retórica pura, enleada em traiçoeira fraseologia pseudo-académica, de um governo maníaco e corrupto cujo primeiro-ministro é o único que se considera com legitimidade para definir aquilo que é necessário ao País, mesmo que seja contra tudo e contra todos, isto é, contra o próprio País.
“Se eu falhar, é o País que falha…” (Passos Coelho). O país sou eu, é o que este súbdito dos mercados externos está a pretender dizer. É já uma questão pessoal para quem tem falhado desde o início mas continua amarrado ao poder pela mão de Cavaco e Silva para prestar um serviço estranho aos interesses nacionais. Em Portugal quem manda? Salazar, Salazar, Salazar! (respondiam os súbditos de então). Em Portugal quem manda? Passos Coelho, Passos Coelho, Passos Coelho! (publicitam os seus reais mandantes de hoje).
Se este governo se mantiver e se tudo se acertar de acordo com os planos que, pelos seus mandantes, lhe vão sendo entregues e com cujo cumprimento cego Passos Celho se comprometeu, é outro país que está a ser criado, imposto pela força e pelo autoritarismo, moldado não pela Democracia, mas pelos Mercados (isto é, pelo capital financeiro) e por outros países. Aqui sim, é caso para dizer com toda a propriedade: “O País falhará!”
Artigo de opinião de Mário Abrantes, publicado em 20 de outubro de 2013