Tempo de festa mas também de votos

mario_abrantesEm três anos de programa de resgate, contrariamente ao anunciado, nenhum objectivo foi alcançado de forma a permitir que, a uma saída oficial da troika, correspondesse uma saída real, isto é, correspondesse um ponto final no aumento da dependência financeira do país e das políticas de austeridade, do empobrecimento, do desemprego, da falta de investimento, da estagnação económica e da degradação acentuada dos serviços públicos, em particular dos de carácter social.
Segundo os dados oficiais, mesmo o valor de 4,4% de défice orçamental alcançado em 2013 é falacioso, pois esse valor realmente atingiria os 8,4%, não fora os mais de 4,5 mil milhões de euros sacados através de cortes e congelamento salariais extraordinários na função pública, do congelamento das pensões, da Contribuição Extraordinária de Solidariedade e da manutenção de um gigantesco aumento de impostos.
Como os dados oficiais confirmam, nenhum crescimento económico sustentado surgiu no lastro das políticas da troika porque o peso da dívida portuguesa não cessou de aumentar, de tal forma que o dinheiro dos cortes na despesa pública e do aumento de impostos entre 2011 e 2013 (28 mil milhões de euros) acabou por ser todo utilizado apenas para pagar juros, não sobrando nem para pagar dívida e muito menos para investir e criar emprego. Para os jovens é o futuro que se esvai, a emigração que chama. O lastro é outro e bem mais inquietante, refiro-me, no caso dos Açores (mas certamente extensível ao todo nacional), ao aumento do número de suicídios entre gente nova que foi atirada para as malhas do desemprego.
A troika e as suas políticas saem sujas e só de nome, pois ficam por via do Pacto Orçamental da UE o qual impõe a redução drástica do défice e da dívida públicos em prazos curtos e impraticáveis, pressupondo a continuação da austeridade violenta e dos cortes na despesa comprometedores de qualquer recuperação económica ou do regresso do país e dos Açores ao desenvolvimento socialmente útil.
O único ajustamento verdadeiramente alcançado ao fim de 3 anos destas políticas foi o acréscimo patrimonial em mais mil milhões de euros dos três mais ricos de Portugal: Belmiro de Azevedo, Américo Amorim e Soares dos Santos.
Com a cumplicidade dos principais órgãos de comunicação social e seus comentadores de serviço, o destaque dado por alguns candidatos, governantes e dirigentes partidários às comemorações da saída da troika ou à polemização da participação de Sócrates na campanha eleitoral, não passam de rastejantes manobras de diversão visando menorizar a consciência política dos cidadãos. Nas eleições de domingo próximo a barricada que verdadeiramente se ergue com importância decisiva para os portugueses é entre os pró-troika e os anti-troika, entre aqueles que subscreveram o resgate e o Pacto Orçamental e os que não os subscreveram. Entre um Portugal, com um quarto da sua população empurrada para o limiar da pobreza, sufocado por uma dívida indiscutível e impossível de pagar, e um Portugal com dignidade e com futuro.
O tempo por cá é de festas do Senhor Santo Cristo e domingo da sua procissão, mas é também o tempo daqueles que, alinhando no lado certo da barricada, não se ficam pela revolta inconsequente e descomprometida da abstenção e optam antes por passar pelas urnas para afirmarem a sua vontade de forma expressa e inequívoca.

 

Artigo de opinião de Mário Abrantes, publicado em 21 de maio de 2014