Artigo de opinião de Mário Abrantes
Com as “tropas” das finanças da UE (Ecofin) reorganizadas em torno do seu líder, o ministro alemão Schauble, regurgitando ultimatos e insultos à soberania, à dignidade da Grécia e à vontade democraticamente expressa pelo seu povo, vai-se apertando o cerco àquele país, e tudo aponta para que, no actual contexto europeu, o desfecho certamente não venha a ser (pelo menos por agora) o mais favorável às suas pretensões enquanto Estado membro.
E não seria de esperar outra reação perante o que é visto pelos atuais dominadores no seio da UE como um pecado de rebeldia intolerável, uma fenda que se abriu no interior de uma fortaleza que eles, à custa de tantos e acumulados esforços (sim, porque sempre houve quem lhes opusesse resistência), têm vindo a construir e a consolidar, investindo nas desigualdades, na destruição dos aparelhos produtivos e na escravidão das dívidas para uns, os mais débeis à partida, com vista a garantir a outros, os mais fortes, a “livre” circulação das suas mercadorias e a maximização dos seus excedentes financeiros (aliás na senda do espírito pioneiro que presidiu à fundação da Comunidade Económica do Carvão e do Aço).
A posição portuguesa, dada a degradação da situação económica e social causada pelo falhanço das políticas restritivas que vêm sendo praticadas há cerca de três décadas, em particular aquelas que nos últimos anos foram formalmente impostas pela UE, o Banco Central Europeu e o FMI, deveria ter sido, pela lógica, instintivamente solidária com a rebelião grega, mas foi antes (como a de outros países em situação similar) de alinhamento total com os restantes membros do Ecofin.
E, vendo bem, também não seria de esperar outra atitude da parte de títeres da oligarquia cujo objectivo prioritário, a qualquer custo social, é afinal, como eles próprios acabam por admitir, não a prossecução de um determinado objectivo nacional, mas simplesmente “garantir a confiança dos mercados”.
Para tentar prolongar no tempo este alinhamento político anti-social (desumano mesmo) em Portugal, e para neutralizar as suas vítimas, esses títeres atiram-nas umas contra as outras: funcionários públicos contra trabalhadores do sector privado, reformados contra trabalhadores, desempregados contra sindicatos, jovens precários contra trabalhadores do quadro, etc. E reclamam mesmo o seu apoio eleitoral acrítico, recorrendo à propaganda manipuladora. Enquanto praticam o pior, não se cansam de repetir que o pior já passou, enquanto aplicam a austeridade, asseguram que já fugimos ao seu cativeiro, enquanto empobrecem a maioria, proclamam a utilidade de criar mais ricos, enquanto cortam na saúde ou na educação, proclamam os benefícios do emagrecimento do Estado, enquanto fomentam a emigração, dizem que o desemprego diminuiu, enquanto aumentam a dívida, dizem que tencionam pagá-la antes do prazo.
Esta propaganda visa em última instância induzir o eleitorado a aceitar as desigualdades económicas e sociais como naturais, a temer mais a resistência que a opressão, a ser colaboracionista com a sua própria condenação e desgraça, a descarregar as suas frustrações no vizinho em lugar do opressor, a aceitar o princípio conformista, contra o qual a Grécia se rebelou, de que na UE sempre houve e sempre haverá (países) ricos e (países) pobres, (países) exploradores e (países) explorados…
É contra estes princípios retrógrados e alienatórios, bloqueadores do desenvolvimento natural e justo da sociedade, que os cidadãos democratas e progressistas, por mais diferenças que os separem, têm por imperativo de consciência de persistir em unir-se, lutar…e votar.