Nos últimos dias tenho ouvido e lido variadíssimos comentários e opiniões sobre os resultados (ainda não totalmente conhecidos) das eleições legislativas de 10 de março. Não há opiniões unânimes, mas muitas das razões apontadas cruzam-se entre si.
Considero fundamental procurar compreender em profundidade os resultados para melhor poder atuar, pois a participação política ativa obviamente que não se esgota nos momentos eleitorais (embora nos façam crer que sim).
Ora bem, concretamente no que respeita ao resultado da extrema-direita em Portugal, penso que se pode afirmar que foi o resultado de “um caldinho” bem elaborado.
Um caldinho que começou com a propaganda e demagogia dos órgãos de comunicação social, numa contínua promoção descarada do partido de extrema-direita. Basta analisar as estatísticas de tempos em antena desde o tempo em que nem deputados eleitos tinham. Um trabalho não inocente, promovido pelos detentores dos meios e um aliciante para as audiências, inserida numa crise grande de atividade jornalística. Junte-se uma pitada de saudosistas (quem não se lembra da eleição de Salazar como o maior português, em 2008?), de racistas e de xenófobos que, antes mais ou menos escondidos noutros partidos ou sem qualquer aproximação à política, viram naquele partido um meio para expressar o que sempre sentiram. Não esquecer o tempero de Marcelo e da procuradora-geral da República (ironicamente ambos tiveram o apoio de António Costa para os respetivos cargos) que tudo fez, ignorando a Constituição da República Portuguesa, para que o governo do PS não acabasse o seu mandato.
Envolva-se tudo isto em anos de políticas erradas, verdadeiras políticas de direita que, à medida que a maioria dos portugueses viam a sua vida a piorar, com o brutal aumento do custo de vida, com a degradação dos serviços públicos essenciais, com o ataque aos direitos dos trabalhadores, no fundo, com a falta de resposta do governo para os problemas, levaram aos lucros estrondosos dos maiores grupos económicos e às contas certas ao jeito de Bruxelas. O PS, do alto da sua maioria absoluta, preferiu guardar milhares de milhões nos cofres do estado enquanto a maioria dos portugueses ficava pior. O apregoado crescimento do país, baseado unicamente no turismo e na atração capital estrangeiro, provocou o aumento das desigualdades e a degradação das funções sociais do estado e isso refletiu-se no dia a dia da maioria das populações. Não esquecer, por fim, uma pitada de casos de aproveitamento de políticos nas suas funções, que é lenha para a extrema-direita atear o fogo.
Com uma população cada vez mais despolitizada e desligada da vida em comum, que apenas é chamada a participar em altura de atos eleitorais e que não têm visto, do resultado destes, nenhuma mudança concreta que melhore as suas vidas, o resultado só podia ser este. Entre estes, preocupa-me sobretudo os mais jovens, mais permeáveis a
discursos populistas e descontextualizados, que crescem neste contexto de uma cada vez maior individualização da sociedade.
Voltarei a este tema na próxima crónica.