fiquei, digamos que, chocado com o que me pareceu ser a principal conclusão da autora sobre a culpa da catástrofe nacional que são os incêndios florestais, bem como de outros males que remetem Portugal para o topo das estatísticas de mais consumo de álcool, mais acidentes rodoviários, casos de sida, gravidez na adolescência, etc., etc. Ao que percebi a principal causa, segundo a autora, é a falta de educação cívica do povo português.
O número crescente de fogos florestais que a cada verão tem vindo a transformar o rectângulo continental num território mais empobrecido económica e ambientalmente é, segundo a opinião de vários especialistas, resultado de um conjunto de factores que conjugados originam não só uma maior quantidade de ignições, mas também condições que facilitam a propagação e uma nova dimensão aos incêndios. O abandono de algumas actividades económicas ligadas à floresta, o abandono dos campos agrícolas, a consequente desertificação humana do interior, a mudança de hábitos de consumo, a não aplicação da legislação que obriga os proprietários florestais (nomeadamente o estado) a fazer a limpeza e o ordenamento das suas matas, as acções de prevenção que não são executadas a par, sem dúvida, das condições climatéricas adversas mas, sobretudo, dos interesses dos madeireiros, dos agentes imobiliários e de quem mais ganha com os incêndios florestais, ou seja, quem comercializa, vendendo ou alugando, o material e equipamento de combate aos incêndios.
Estes são alguns dos factores que os especialistas referem como as principais causas desta calamidade pública, que não deixa de ser, isso mesmo, só porque o Governo não o decreta. Na listagem dos factores conhecidos e reconhecidos pelos especialistas não se encontra a educação cívica do povo português. A culpa tem dono. Não me parece é que o dono da culpa seja o povo ou a sua incivilidade. Nesta, como noutras situações, a responsabilidade que podemos atribuir ao povo é não ter, ainda, despertado para exigir com veemência que os governos que elegem façam aquilo a que estão obrigados – GOVERNAR. Governar para o país que representam e para o povo que os elege. A responsabilidade não pode ser, nem é essa a minha pretensão, assacada ao actual governo ou ao que o precedeu. A culpa pode e é, no entanto, imputável a todos os governos deste país que, tal como o actual e o que o precedeu, têm governado para satisfazer interesses que não são propriamente coincidentes com o interesse nacional.
A política agrícola e florestal, o ordenamento do território, a prevenção e os dispositivos de combate a incêndios são, em primeira e última instância, da responsabilidade dos governos e, se hoje temos a floresta e a agricultura que temos, isso resulta directamente das políticas adoptadas e não da vontade ou da incivilidade do povo português Quanto à educação cívica dos povos é, nem mais nem menos, o reflexo das políticas de educação e formação que os governos executam e da forma como os “eleitos” exercem o poder que o “incivilizado” povo português lhes conferiu. O exemplo dado pelo Eng. José Sócrates ao manter-se de férias com o país a arder é no mínimo demonstrativo de irresponsabilidade e desgoverno que, não sendo atributo apenas deste executivo, também o é.
E não adianta o primeiro-ministro vir para a televisão com ar zangado e a fazer “birrinhas”, até porque com menos de seis meses de trabalho na administração pública tenho algumas dúvidas que já tivesse ganho o direito a gozo de tantos dias de férias. Registo como positivo o anúncio, igualmente feito na segunda-feira, pelo Presidente do Governo Regional dos Açores do envio de um contingente de 25 bombeiros açorianos para o continente a fim de integrarem as forças que no terreno combatem os incêndios florestais. Esta louvável e solidária decisão só peca por tardia.
Ponta Delgada, 22 de Agosto de 2005 Aníbal C. Pires