As ilhas açorianas são possuidoras de um património paisagístico e
ambiental único, cada uma com os seus encantos e graciosidade que as
torna diferentes entre si e parte de um todo cultural construído por
mais de cinco séculos de convivência com um ambiente natural generoso e
fecundo mas por vezes devastador nas suas manifestações telúricas,
eruptivas e atmosféricas que empurraram muitos açorianos para lá do
horizonte das ilhas.
Outros motivos houve para que os açorianos rumassem para Oeste na procura do sonho americano, razões que permanecem no tempo embora o rumo já não seja apenas para Ocidente e com uma dimensão que, não sendo dramática, é característica de que o desenvolvimento harmonioso e o sonho estão aquém do desejado e, anunciado profusamente a cada entrevista dos membros do governo e do seu presidente.
Com as expectativas goradas por políticas nacionais e regionais que acentuam o fosso entre quem detém a riqueza e quem vive do trabalho e sublinham as assimetrias de desenvolvimento regional, esquecendo as ilhas que ficam fora do tradicional eixo Ponta Delgada, Angra e Horta, e, com o futuro a perspectivar que também este tradicional eixo perca importância, face à ideia fixa que mercado e dimensão económica só mesmo em S. Miguel. Opiniões e opções que, não partilho por considerar que o potencial económico açoriano, nomeadamente em relação ao turismo, vale pelo todo e não por, apenas, algumas parcelas da Região.
Mas antes dos visitantes interessam os autóctones, independentemente da ilha onde residem. Interessa que se dê prioridade ao que é essencial e se secundarize o acessório, interessa que se garantam às populações as condições para que a opção seja ficar, regressar ou, mesmo, a adopção daquele lugar, daquela ilha como uma escolha de residência, uma opção de vida. Ou seja, garantir atractividade a cada uma das ilhas e isso só é possível, desde logo, com uma política de transportes adequada às necessidades dos cidadãos e das economias de cada uma das ilhas mas, também que os serviços públicos sejam efectivamente garantidos e que a actividade económica revitalizada.
As ilhas de menor dimensão sofrem de um problema que se situa à cabeça das preocupações de quem se preocupa verdadeiramente com a Região e não está amarrado a preconceitos redutores que advêm de incompreensíveis “bairrismos”, nem à ideia dominante de que tudo deve ser conformado ao mercado e à competitividade da economia globalizada.
O declínio populacional, que afecta a maioria das ilhas, decorre do saldo natural mas não só. As migrações internas são também um factor de considerável importância e que a imigração não chega para colmatar.
Não considerar este como um grave problema de coesão para o qual têm de se encontrar soluções integradas e participadas é um erro de gravidade incomensurável do qual já se começam a sentir os efeitos.
Estive, recentemente, na Graciosa onde confirmei esta e outras preocupações para as quais já tive oportunidade de chamar a atenção noutros fóruns de intervenção política e de exercício de cidadania.
A ilha à qual foi dada a designação de Graciosa pelos seus encantos naturais, pela sua orografia e dimensão tem no presente um problema devidamente identificado e do qual já se começam a sentir os efeitos. Refiro-me à escassez de água potável. As rupturas de abastecimento já se fazem sentir e a qualidade da água já não é a melhor pois a infiltrações nos aquíferos subterrâneos por água do mar está a dar-lhe característica de salobridade. Quanto a isto o governo regional diz nada!
Os investimentos públicos na Graciosa os anunciados, por concretizar, e os concretizados também deixam muito a desejar. A construção do novo edifício escolar onde se pretende concentrar toda a população estudantil é caminho para a descaracterização do espaço rural e contraria qualquer política de coesão territorial e social. O porto da Praia e a intervenção que ali está a ser feita vai, a prazo, em nome de um segmento de actividade do qual ainda não se percebeu qual é a estratégia, acabar com a praia que lhe deu o nome.
Quando se atira dinheiro para cima dos problemas e não se procuram soluções integradas e sustentadas, apenas se adiam as dificuldades. Com o tempo só o dinheiro desaparece tudo o mais subsiste e se agrava.
Anibal Pires no Jornal "A União" em 19 de Agosto de 2008