E os cargos governativos, para onde saltam os seus alunos mais aplicadinhos, vão vendendo e privatizando (aquilo que não era seu antes, porque era de todos), buscando em troca, pelo serviço prestado, autorização para se… auto-governarem. Esvaziam-se competências públicas mas acumulam-se rendimentos e honrarias para quem as perde (as competências, claro!). À pala do Representante Especial da República, segundo Mota Amaral, que agora o quer fazer Vice-Cavaco das Índias, perdão, dos Açores; à pala da Associação de Municípios, segundo Berta Cabral, que queria 200 contos por senha de presença; à pala de Paulo Gusmão, e dos deputados do PSD e PS que se lhe seguem, que, em surdina, pretendem aumentar o pecúlio e o património institucional próprio.
E cada vez estas gentes mais se afastam (convenientemente) do que está acontecendo cá fora (…naturalmente e de acordo com os princípios sagrados de que isso é com a “livre iniciativa”), e apenas se comprometem, em jeito de competência institucional relevante, a atribuir os subsídios ou incentivos a uns, considerados adequados para “dinamizar” a economia, e a carregar sobre salários, direitos e carga fiscal, a outros, em nome da justiça social (?)… Mas a vida cá fora vai acontecendo e vai dando lições que apenas o distanciamento (conveniente) impede que sejam aprendidas em tempo por quem as havia de tomar. Primeiro exemplo: Quantos milhões desbaratados em compensações e passagens vendidas durante 6 anos para alimentar a voracidade da Açorline na prestação de um serviço executado de forma medíocre? Quantos milhões ainda para gastar em mais indemnizações compensatórias à nova concessionária que se apresentou a concurso com a intenção de encaixar em três anos a modesta quantia de 4,5 milhões de euros de lucros? Tudo isto para entretanto se descobrir que o sector público é que deveria tomar a seu cargo a operação do transporte marítimo inter-ilhas, e que, dessa forma, as indemnizações compensatórias tenderiam para custo zero, sem prejuízo para a Região, sendo tal operação montada de forma economicamente racional e podendo prestar um serviço de maior qualidade aos passageiros, incluindo ao turismo.
Segundo exemplo: A Região não pode intervir na definição do preço do leite; a Região não pode intervir na distribuição de quotas leiteiras; a Região não pode…e o que acontece entretanto ao domínio da “livre iniciativa” num sector basilar da economia regional como é o da produção leiteira, com rácios de produtividade, dimensão, eficiência e competitividade reconhecidamente elevados? Pura e simplesmente o monopólio deliberativo da BEL conjugado com as imposições dos países de onde a BEL é originária; a ditadura dos preços baixos (dos mais baixos de toda a Europa comunitária), e a ditadura das limitações à produção. Um perfeito garrote, politicamente provocado por omissão, cuja resolução aponta a Bermuda (a emigração está de volta) como porta de saída para os agentes produtivos do sector, e o seu desmantelamento a médio prazo, sem alternativa credível em economia de escala. Para os poderes públicos, tanto nacionais (quando por exemplo se fala do desemprego), como regionais (quando por exemplo se fala do sector leiteiro), a reserva de competências, em nome desta sacrossanta (ir)racionalidade económica, fica-se pelo direito de afirmarem: “Lamento, tenho pena, mas não posso intervir…”
Mário Abrantes, In Jornal dos Açores, 06/02/16