Sobre os transportes marítimos

jose_decq_motta.jpg1. A evolução havida no transporte marítimo de mercadorias, nos últimos 20 anos é muito grande e positiva no seu conjunto. Hoje há mais e melhor transporte. Há melhor preservação das mercadorias. Há melhor e mais regular abastecimento a todas as ilhas.
Tudo isto que foi feito neste sentido corresponde à satisfação de um direito que nos assiste, pois o facto de sermos uma região insular distante não nos pode prejudicar, nem no contexto nacional, nem no contexto europeu. Temos entretanto que ter em conta que nem tudo está perfeito e nem tudo está devidamente equacionado. Por outro lado continua a haver, quem, dentro de portas defende transformações negativas. No que respeita ao último aspecto referido, ou muito me engano, aos que sempre agiram nesse sentido, continuam a procurar canalizar todas as importações e exportações para os Portos de Ponta Delgada e Paria da Vitória. Para conseguirem isso recorrem a tudo e procuram mesmo motivar intervenções (alusivas) da Comissão Europeia, intervenções essas que podem facilitar o seu caminho. Temos que continuar a ter linhas concessionadas e frequências preestabelecidas das escalas nas diversas ilhas. Precisamos também de criar condições para uma mais larga e sistemática utilização da capacidade disponível de transporte dos Açores para o exterior, para enviar resíduos para reciclagem, tratamento ou eliminação. Sem isso nunca conseguiremos atingir um nível adequado no tratamento de resíduos sólidos. Temos que estar atentos às manobras que estão, neste momento, a ser feitas e que podem introduzir desregulações e retrocessos nos transportes marítimos e de mercadorias.
 
2. Com a generalização do transporte aéreo o transporte marítimo de passageiros praticamente morreu, com excepção das sempre mais usadas ligações entre o Faial e o Pico. Depois de 1996 o Governo Regional encetou uma experiência que levou ao ressuscitar, em parte do ano, o transporte marítimo de passageiros. Com essa experiência ficou demonstrado que há espaço para esse tipo de transporte, na parte do ano em que as condições meteorológicas favorecem as deslocações por mar. Ficou demonstrado ser útil associar ao transporte de pessoas o transporte de viaturas. Não ficou demonstrado se o investimento público feito durante todos esses anos nesta operação foi suficientemente equilibrada e eu, pessoalmente, inclino-me a pensar que houve alguns que ganharam abusivamente dinheiro fácil com esta questão. Defendo entretanto que esta operação tem que continuar mas com um mais elevado padrão de qualidade e segurança. Caso particular no conjunto dos transportes entre o Faial, Pico São Jorge. Processa-se todo o ano e é indispensável ao desenvolvimento destas ilhas. Na minha opinião tem que contemplar pessoas e viaturas. Tem que ter frequências que dêem resposta à forma e tem que utilizar navios adequados aos portos existentes. Para além daquilo que foi vagamente anunciado pelo Governo teria grande importância que a Associação de Municípios do Triângulo fosse chamada pelo Governo Regional a pronunciar-se sobre os vários aspectos desta importante questão. Não é suficiente constituir uma Sociedade Anónima de capitais para comprar navios. Não é suficiente dizer-se os metros que os navios vão ter. É indispensável que todas as acções a desenvolver nos transportes vão no sentido da valorização deste conjunto de ilhas que a natureza colocou tão perto umas das outras. Por isso fica aqui o apelo.
 
3. Aqui não chegará nunca o TGV, nem precisamos de nenhuma OTA. Da Europa para os Açores nunca será construída qualquer auto-estrada de 4, 6 ou 8 faixas. Mas nós estamos aqui e precisamos que existam navios modernos e rápidos para mercadorias e para passageiros entre as ilhas. Precisamos que as mercadorias cheguem, em condições, a todas as ilhas e não apenas a dois portos de entrada. Precisamos que, nas ilhas mais próximas, o mar deixe de ser o obstáculo na ligação que ainda, de certo modo é. Precisamos, numa palavra, que a política de transportes marítimos evolua bem, de forma organizada, apoiada e tutelada e não da forma selvagem que alguns almejam para se aproveitarem disso.
 
José Decq Motta no Tribuna das Ilhas em 3/03/2006