Foi hoje discutida no Parlamento Regional a proposta do PCP para rejitar o Memorando de entendimento assinado entre o Governo Regional e o Governo da República e que obriga a Região a reduzir funcionários públicos, a aplicar todas as medidas de austeridade e a ter o seu orçamento regional previamente aprovado pelo Ministro das Finanças, naquele que é um ataque inaudito à Autonomia dos Açores. A proposta foi rejeitada com os votos favoráveis de todas as bancadas e apenas com os votos contra do PS.
Na sua intervenção Aníbal Pires assinalou que o verdadeiro objectivo político por trás deste Memorando é o de amarrar os Açores ao cumprimento do Acordo com a Troika que o PS negociou e também subscreveu e recordou que é o Governo Regional que vai ser beneficiado pela austeridade, embolsando os cortes e reduções que serão impostas aos Açores por este Memorando.
INTERVENÇÃO DO DEPUTADO ANÍBAL PIRES
NO DEBATE DA PROPOSTA DO PCP
PARA REJEITAR O MEMORANDO DE ENTENDIMENTO
ASSINADO ENTRE O GOVERNO REGIONAL E O GOVERNO DA REPÚBLICA
Senhora Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,
Senhor Presidente do Governo Regional,
Senhora e Senhores Membros do Governo,
Para que serve a Autonomia?
Para quê e com que objetivo resolveu o legislador Constitucional consagrar no artigo 6º da Constituição que “Os arquipélagos dos Açores e da Madeira constituem regiões autónomas dotadas de estatutos político-administrativos e de órgãos de governo próprio”?
Foi ou não foi para promover a participação democrática dos cidadãos, o desenvolvimento económico-social e a promoção e defesa dos interesses regionais, como está dito no artigo 225º da Constituição?
Serve por isso, para que sejamos nós, aqui nos Açores, e mais ninguém a definir democraticamente os melhores caminhos e as melhores políticas para o desenvolvimento da nossa Região.
Serve para nos permitir criar mecanismos para compensar os custos de insularidade, sim, mas serve também para proteger os Açores das políticas da República que, quando aplicadas ao nosso arquipélago, lesam o interesse regional e prejudicam a qualidade de vida dos açorianos.
Depois de uma luta de séculos, a aurora libertadora do 25 de Abril permitiu-nos, finalmente, conquistar esse direito, essa liberdade. É apenas por isso que estamos todos aqui agora nesta sala. A defesa da Autonomia democrática é o nosso primeiro dever!
Esse é o sentido político da nossa proposta: recuperar a Autonomia dos Açores que foi alienada por um acordo iníquo, ilegítimo e ilegal.
Senhora Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,
Senhor Presidente do Governo Regional,
Senhora e Senhores Membros do Governo,
É a avaliação desse chamado “Memorando de Entendimento” entre o Governo Regional e o Governo da República que nos cumpre aqui fazer. E poderíamos, talvez, resumi-las a três perguntas fundamentais:
O Memorando extravasa ou não o que são as competências do Governo Regional e invade ou não as competências deste Parlamento?
O Memorando prejudica ou não o desenvolvimento da Região e o bem-estar dos açorianos?
O Memorando retira ou não direitos à Região, alienando a nossa Autonomia?
Quanto à primeira pergunta:
Quando se impõe que a Região aplique todas as medidas que visam garantir o cumprimento dos objetivos do Programa de Ajustamento Económico e Financeiro; Quando se obriga a que a Região reduza o número de funcionários públicos e aplique zelosamente todos os cortes de que o Governo da República, ficando proibida de tomar qualquer medida compensatória, não se está a invadir as competências da Assembleia Regional?
A quem é que pertence, afinal, a competência para legislar sobre matéria orçamental ou sobre a organização da Administração Pública?
Penso que a resposta é iniludivelmente clara para toda a gente: Com este Memorando, o Governo regional usurpou ilegalmente as competências que pertencem à Assembleia Regional e assumiu compromissos em matéria que não lhe compete decidir.
Quanto à segunda pergunta:
Conhecemos bem o agravar da recessão económica no nosso arquipélago e a sua face mais grave e mais visível, o desemprego. Quando nos obrigam a aplicar com zelo medidas de austeridade cada vez mais pesadas, estaremos a contribuir para inverter esse ciclo vicioso? Quando nos condicionam na nossa capacidade de investimento, sacrificada à obsessão orçamental, estaremos a insuflar algum ânimo e dinamismo económico na Região? Quando nos forçam a reduzir postos de trabalho na Administração Pública, estamos a combater o desemprego?
Não. Quando seguimos esse rumo alegremente subscrito pelo Governo Regional, o que estamos a fazer é a cavar mais fundo o fosso da recessão, a empurrar mais e mais açorianos para o desemprego, a aumentar deliberadamente a crise nos Açores.
Finalmente, quanto à terceira, por ventura a mais fundamental das perguntas: O Memorando prejudica ou não os direitos da Região, limita ou não a nossa Autonomia?
Se o que enumerámos até aqui não bastasse para responder, o enunciado no ponto 5 do Memorando definitivamente chega: A Região passa a estar obrigada a enviar a proposta de Orçamento Regional para pré-aprovação pelo Governo da República, antes mesmo de esta ser do conhecimento desta Assembleia! É a marca, real, da perda do pilar mais relevante da Autonomia: Deixamos de poder dispor livremente das nossas receitas. Deixamos de ser uma Assembleia legítima, porque democraticamente eleita, para passar a ser um conselho de gestão!
Fica assim claro o conteúdo e a consequência deste Memorando de Entendimento. Os Açores deixam de ser livres e passam a ser tutelados!
Senhora Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,
Senhor Presidente do Governo Regional,
Senhora e Senhores Membros do Governo,
O Governo Regional foi mandatado, em eleições livres e legítimas, para garantir a sustentabilidade das contas públicas. Assumidamente não conseguiu cumprir esse encargo que o Povo Açoriano lhe atribuiu.
Compete-lhe, por isso, agora, resolver o problema que a sua própria incapacidade gerou. Mas isso não lhe dá nem competência nem legitimidade para ir entregar ao credor a Autonomia que os açorianos demoraram séculos a conquistar!
A necessidade de assumir compromissos para obter um empréstimo da República, entende-se, aliás, enquadra-se perfeitamente no espírito da solidariedade e coesão nacionais, previstos na Constituição e no estatuto Político-Administrativo. No entanto, isso de forma nenhuma autoriza o Governo a alienar o núcleo fundamental das competências autonómicas.
Ninguém, nenhum de nós, foi mandatado ou tem qualquer espécie de legitimidade para acabar com a Autonomia dos Açores!
Senhora Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,
Senhor Presidente do Governo Regional,
Senhora e Senhores Membros do Governo,
O verdadeiro objetivo político por trás deste Memorando é claro: Amarrar os Açores ao cumprimento do Acordo com a Troika que o PS negociou e também subscreveu. O que o PS pretende com este Memorando é impedir que a Autonomia Açoriana possa ser usada para minimizar os efeitos mais gravosos da política da Troika.
E assume esta atitude vergonhosa porque sabe que é justamente o seu Governo Regional que vai ser beneficiado pela austeridade. Vai ser o Governo Regional que vai embolsar os cortes e reduções que nos serão impostas por este Memorando.
Assim, vão poder – tal como fazem em relação à Lei das Finanças Regionais – atirar com todas as culpas para o Governo Passos Coelho / Paulo Portas e meter ao bolso o dinheiro roubado aos açorianos!
O PS se, por um lado, critica a austeridade e exige a renegociação do Acordo com a Troika, por outro, defende o Memorando que nos obriga a aplicá-lo. Em que ficamos, meus senhores?
Primeiro arruínam a Região para pagar os custos da sua rede de clientelas e garantir a sua sobrevivência no poder. Depois, entregam de mão beijada a Autonomia que demorou centenas de anos a conquistar em troca de uns cobres para ir tapando alguns buracos! É vergonhoso e inaceitável!
Antes endividados que à Troika sujeitos!
Senhora Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,
Senhor Presidente do Governo Regional,
Senhora e Senhores Membros do Governo,
A nossa proposta diz respeito à rejeição, no imediato, de um Memorando ilegal, ilegítimo e inaceitável. Mas diz sobretudo respeito àquele que é o primeiro dever deste Parlamento:
Defender a liberdade do nosso Povo, recuperar a nossa Autonomia!
Disse.
Horta, 19 de Fevereiro de 2013
O Deputado do PCP Açores
Aníbal Pires