Os eleitos municipais da CDU, Valentina Matos e José Decq Mota, apresentaram hoje uma proposta para banir os herbicidas à base de glifosato de todos os espaços públicos do Concelho da Horta, bem como para que sejam realizadas análises específicas à água para consumo humano, para detectar a presença desta substância química, que é altamente perigosa para a saúde humana e para o ambiente.
No Concelho da Horta, este herbicida é utilizado rotineiramente como forma de controlo das infestantes, tanto dentro, como fora dos centros populacionais, não havendo qualquer tipo de alertas aos utentes de espaços como os parques, jardins e até mesmo o mercado municipal da cidade antes, durante ou após a sua aplicação, o que pode ser extremamente perigoso.
A proposta da CDU será discutida na próxima sessão da Assembleia Municipal.
Proposta de Recomendação
O Glifosato (N-fosfonometil-glicina) é um herbicida de amplo espectro e ação não-seletiva, que se aplica após a planta ter emergido do solo (pos-emergente). Esta substância activa surge em cerca de 60 formulações, com diferentes nomes comerciais, sendo os mais os herbicidas compostos Roundup®, Rodeo®, Bronco® e Weedoff®. Este é um dos herbicidas mais utilizados na agricultura mundial, com crescimento constante dos casos de intoxicações acidentais e profissionais. Em Portugal, o Glifosato é o herbicida mais utilizado e, apesar das recentes restrições à venda e aplicação de herbicidas e pesticidas, continua a poder ser adquirido livremente em várias superfícies comerciais de grande dimensão da cidade Horta.
Apesar de a Organização Mundial de Saúde, por intermédio da sua Agência Internacional para a Investigação sobre o Cancro, ter classificado esta substância como «Carcinogénico provável para o ser humano», a sua aplicação é ainda practicada de forma recorrente não só por particulares, como também por autarquias, como o Município da Horta, sendo que, segundo a Direcção Geral de Alimentação e Veterinária, só no ano de 2013, foram vendidas mais de 1000 toneladas deste produto em Portugal, assistindo-se a uma tendência crescente do seu uso nos últimos anos.
Isto é em parte explicado pelo facto de a multinacional Monsanto ter vendido o Roundup para departamentos municipais de parques e jardins e também a consumidores como sendo biodegradável e estando de acordo com o meio ambiente, promovendo seu uso em valetas, parques infantis, campos de golfe, pátios de escola, relvados e jardins privados. É de referir que um tribunal francês sentenciou que esse marketing equivalia a publicidade enganosa.
A perigosidade deste produto é acrescida pelo facto do Glifosato ser bastante estável, tendo uma tempo de semi-vida no solo de 30-60 dias e podendo ser facilmente arrastado por efeitos de lixiviação devido à sua grande solubilidade. Apesar de alguns estudos considerarem que o Glifosato tem um baixo risco de contaminação das águas subterrâneas, cerca de metade das amostras, em análises à água realizadas em Espanha, revelaram a sua presença ou do seu metabolito de degradação, sendo que o grau de contaminação em Portugal é ainda desconhecido devido à ausência de amostragem.
Adicionalmente, esta substância parece ser bioacumulativa, ou seja, à semelhança dos metais pesados, tende a acumular-se no organismo das plantas e animais que o consomem, levando a que, em vários casos, a sua concentração em tecidos e fluidos corporais exceda em muito os valores considerados aceitáveis para a água potável ( 0.1 μg/l). É de destacar que, num estudo sobre este tema, o Glifosato foi encontrado em todas as amostras de urina humana, numa população urbana na Alemanha, em concentrações 5 a 20 vezes superiores e que outras análises revelaram a sua presença em concentrações de 0.2 a 0.4 μg/l, até no leite materno na Alemanha, enquanto que nos EUA, este valores sobem para um máximo de 18.8 μg/l na urina e 166 μg/l no leite materno.
Assim, moléculas de Glifosato vaporizado sobre ervas daninhas à beira de uma estrada podem, em teoria, ser passadas, vários meses depois, a um bebé de colo no leite materno, bastando para isso que o Glifosato, arrastado pela chuva, acabe numa captação de água, seja absorvido por vegetais utilizados na alimentação humana ou até mesmo por plantas consumidas por gado cujos derivados sirvam para alimentação humana.
Para além de ter sido encontrado na urina e leite materno, esta molécula foi também detectada no sangue humano em 18 países. Num estudo recente intitulado ‘The effect of metabolites and impurities of glyphosate on human erythrocytes (in vitro)” chegou-se à conclusão que o Glifosato e outros ingredientes encontrados no RoundUp levam a efeitos negativos significativos sobre as células dos sangue. Em termos de exposição a longo prazo, foi recentemente estabelecida a relação entre este herbicida e um cancro do sangue - o Linfoma não-Hodgkin ( Linfoma Não-Hodgkin e Exposição Ocupacional a Grupos Químicos de Pesticidas Agrícolas e Ingredientes Activos: Uma Revisão Sistemática e Meta-Análise). Curiosamente ou não, em Portugal, todos os anos surgem cerca de 1700 novos casos deste tipo de cancro, apresentando uma taxa de mortalidade superior à média da União Europeia.
A perigosidade desta substância para a saúde é amplamente reconhecida por várias entidades e o próprio Bastonário da Ordem dos Médicos afirmou, num editorial da Revista da Ordem dos Médicos, que: “O mundialmente reconhecido princípio da precaução estabelece que, face a evidências nítidas de impacto negativo na saúde (ou no ambiente), a ausência de provas científicas definitivas não deve impedir a implementação de medidas minimizadoras. Para o Glifosato a conclusão é clara: este herbicida deveria ser suspenso em todo o mundo.”
Outro estudo recente (Bioaccumulation of glyphosate and its formulation Roundup Ultra in Lumbriculus variegatus and its effects on biotransformation and antioxidant enzymes) concluiu ainda que a formulação Roundup Ultra tem um impacto ecotoxicologico mais relevante que o Glifosato por si só. Apesar de nem sempre se ter podido provar uma relação directa entre o aparecimento de patologias e a exposição ao Glifosato/RoundUp, estes compostos foram implicados numa série de patologias humanas (desde malformações congénitas, efeitos desreguladores hormonais, cardiotóxicos e carcinogénicos) bem como no “Síndroma do Colapso das Colmeias” que actualmente ameaça a agricultura comercial de vários países.
No entanto, o Glifosato continua a ter uma utilização muito alargada na agricultura em geral e usos domésticos, sendo também amplamente usado na limpeza de vias públicas e também em linhas de água para controlo de infestantes.
No Concelho da Horta, este herbicida é utilizado rotineiramente como forma de controlo das infestantes, tanto dentro, como fora dos centros populacionais, não havendo qualquer tipo de alertas aos utentes de espaços como os parques, jardins e até mesmo o mercado municipal da cidade antes, durante ou após a sua aplicação.
Igualmente grave é o facto de não serem realizados quaisquer testes sobre a presença deste veneno quer nos espaços onde ele é aplicado, quer, mais importante na água que é fornecida à população.
Tendo em conta o grau de perigosidade para a Saúde Pública desta substância, os Deputados Municipais da CDU, ao abrigo da alínea k) do nº2 do artigo 25º da Lei n.º 75/2013, de 12 de Setembro e da alínea e) do artigo 23º do Regimento da Assembleia Municipal da Horta, propõem à Assembleia Municipal que recomende à Câmara Municipal da Horta que:
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Que a Câmara Municipal da Horta cesse imediatamente a aplicação de herbicidas contendo Glifosato, em todos os espaços Públicos do Concelho onde haja uma elevada probabilidade de os cidadãos estarem expostos ao mesmo (jardins, parques, escolas, lares e outros), bem como locais onde se faça a venda de alimentos ao ar livre (nomeadamente o mercado municipal);
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Que a Câmara Municipal da Horta, em cumprimento da Lei n.º 26/2013, de 11 de Abril, que transpõe a Directiva 2009/128/CE, cujo nº 3 do artigo 32º estipula que “Em zonas urbanas e de lazer só devem ser utilizados produtos fitofarmacêuticos quando não existam outras alternativas viáveis, nomeadamente meios de combate mecânicos e biológicos.”, prepare, em parceria com as Juntas de Freguesia, um plano de erradicação completa deste produto e redução do uso de produtos fitofarmacêuticos em geral, preparando opções alternativas à sua aplicação pelos organismos públicos, bem como sessões de esclarecimento para os privados com o mesmo fim;
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Que a aplicação de herbicidas e pesticidas passe a ser explicitamente sinalizada, por forma a que os cidadãos tomem as necessárias medidas para evitar a exposição aos mesmos, durante e após a sua aplicação, acabando-se com situações em que funcionários, sem qualquer equipamento de protecção, pulverizam um líquido incolor em espaços apinhados de gente, sem qualquer informação sobre o que está a acontecer;
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Que a concentração de Glifosato nos diferentes pontos de captação de águas da ilha seja analisada (até hoje, este teste nunca foi realizado dos Açores), a fim de assegurar que os seus valores não estão acima dos legislados, que na União Europeia são de 0.1 μg/l para os pesticidas individualmente e 0.5 μg/l na totalidade de pesticidas (Directiva - Quadro da Água);
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Seja dado conhecimento à Assembleia Municipal dos resultados do penúltimo ponto, bem como sobre a execução das intervenções propostas nos pontos anteriores.
Os Deputados Municipais da CDU Faial