Investir para sair da crise

anibal_pires.jpgOs relatórios da OCDE e do Banco de Portugal, recentemente divulgados, não prenunciam nada de bom para a economia e aconselham a insistir no erro. A crise que económica e social que Portugal enfrenta se bem que mantendo muitas das características de outros períodos recessivos a verdade é que o contexto da actual crise tem contornos diferentes.
Estranhamente não são referidos pelos especialistas da OCDE e do BM. A economia portuguesa perdeu e vai continuar a perder competitividade porque as empresas portuguesas mantêm a especialização na produção de mercadorias tradicionais baseadas no trabalho intensivo e de baixo valor acrescentado. Este é o diagnóstico. O caminho a seguir, segundo a OCDE e o Banco de Portugal é de continuidade da política de redução da despesa (leia-se diminuição do investimento) em função do combate ao défice e do cumprimento do Pacto de Estabilidade e Crescimento. A economia portuguesa pelas suas características não pode competir nos mesmos mercados onde os países asiáticos colocam produtos de baixo conteúdo tecnológico e capital humano intensivo a preços imbatíveis e, é bom lembrar, que Portugal ao aderir à União Monetária, perdeu instrumentos macroeconómicos que, anteriormente, poderiam ser utilizados para ultrapassar esses “handicaps”.
 
De facto a precipitada adesão à moeda única, dos 15 apenas 11 aderiram, levou a que a economia portuguesa, assente na produção de produtos de baixo valor acrescentado, perdesse paulatinamente quotas no mercado internacional. Por exemplo a procura externa dos nossos parceiros aumentou, em 2005, 5% mas as exportações portuguesas cresceram apenas 1%. Dar continuidade à política que tem vindo a ser seguida e reduzir o investimento não é solução para a crise, a não ser, que se aceite como solução para Portugal a caridade proposta pelo Presidente da República, no seu “Plano de Inclusão Social” ou, vira o disco e toca o mesmo, o ”Complemento de Solidariedade” com que o Primeiro Ministro secundou a proposta de Cavaco Silva. Os padrões de especialização da economia portuguesa, tenho disso perfeita consciência, não se alteram apenas porque o desejamos. Para o alterar é necessário um investimento, que não se vislumbra, que modernize e, sobretudo, valorize e qualifique os recursos humanos.
 
Em Portugal 72% da população activa dispõe apenas do ensino básico ou menos como habilitação académica. O maior agravamento das políticas seguidas e aprofundadas pelo actual governo com o objectivo de diminuir o défice à custa da diminuição da despesa, aconselhado pelos especialistas da OCDE e do Banco de Portugal só pode ter um significado – a diminuição do investimento. Investimento que, apesar das condições favoráveis de financiamento, diminuiu em 2005, elevando para 15% a redução acumulada desde 2002 e, a previsão de para 2006 é que o investimento seja inferior em 27,8% ao de 2005. A necessidade de ruptura com esta política de insistência no erro torna-se, cada vez mais, num imperativo nacional.
 
Anibal Pires, IN Expresso das Nove, Ponta Delgada, 05 de Maio de 2006