Nos Açores e um pouco por todo o país, contra os desígnios brincalhões do governo central, registou-se um saudável e volumoso desvio à in-tolerância de ponto carnavalesca. Mas, cinzas adentro, e sem limite de tolerância, outras mascaradas menos saudáveis e efectivamente prejudiciais prosseguem.
A primeira: Um empréstimo sem juros ao Orçamento de Estado, sacado imperativamente pelos brincalhões, aos já rateados e amputados salários de cada um, a partir deste mês, disfarçado de retenção na fonte do IRS. Mascarada que se vai prolongar por todo o ano, para simular, no seu final, o controlo de um défice inatingível senão por expedientes artificiais como este, e que apenas resulta em acumulação sucessiva dos níveis de carência, de pobreza e dificuldades criadas à esmagadora maioria do povo português…Carradas de razão (felizmente cada vez menos amordaçável) têm aqueles que ultimamente se fizeram ouvir, com maior veemência crítica, por ocasião de certas visitas públicas programadas tanto pelo Presidente da República como pelo Primeiro-ministro!
A segunda: Uma intolerável, antecipada e muito pouco ética campanha eleitoral de dois foliões da política regional, para “tolerar” até à data da campanha oficial, a qual ainda não está marcada e apenas terá lugar lá mais para o fim do ano. Omitindo a parte do erário público que nela está a ser consumida, este disfarce de campanha, milimetricamente coberta pela comunicação social sem que se compreenda a razão, sustenta-se em tempo coincidente com o pleno exercício das funções institucionais dos foliões. Muito provavelmente com o meu dinheiro há portanto quem esteja a fazer nos Açores campanha eleitoral por um partido que pode ser diferente do meu. E se eu porventura, em nome de outro partido qualquer, que não o PS ou o PSD, quisesse entrar também nessa mascarada, para a qual nenhuma regra está estabelecida e que dá pelo nome de “candidato à presidência do governo regional” (cargo que não é directamente elegível, como se sabe), seria irremediavelmente despedido nos dias a seguir, por faltas injustificadas ao serviço...Tal é o estado actual da enjeitada liberdade de escolha dos açorianos!
E a terceira, para terminar: Sempre a agravar-se nos últimos 5/6 anos, não há memória de queda tão abrupta no emprego, entre dois trimestres consecutivos, como aquela que se verificou no final de 2011. O desemprego é estrutural, especialmente no sector produtivo, e, pelo não-trabalho que assim gera, agrava o decréscimo do PIB, ou seja torna mais difícil o pagamento da dívida, empurrando o país para o caminho da Grécia. E tanto o governo central PSD/CDS, como o regional PS, não fogem a afirmar que a situação continuará a agravar-se no primeiro trimestre de 2012, ao mesmo tempo que em cumplicidade “troikista” tratam de cortar nos subsídios de desemprego, mas nem por isso deixam de exibir de boca cheia o esforço político que fazem para o combater. Sem fim de tolerância à vista, é assim a mascarada: António José Seguro (PS) afirma que o vergonhoso acréscimo do desemprego nacional é consequência da política do governo de Passos Coelho (PSD/CDS), pretendendo com isso sugerir que o PS é que atalharia o problema com medidas adequadas. Berta Cabral afirma que o vergonhoso acréscimo do desemprego regional é consequência da política do governo de César (PS), pretendendo com isso sugerir que o PSD é que atalharia o problema com medidas adequadas.
Até quando esta farsa trágica, ilusória da tolerância do eleitorado, sobre a hipotética vantagem das medidas de um relativamente às do outro para travar um mal que os dois, de acusação em acusação, enquanto oposição, afinal provocam e agravam, quando alcançam o poder?
Artigo de opinião de Mário Abrantes, publicado em 22 de fevereiro de 2012