Autonomia sob fogo cerrado em 2014

mario_abrantesManter em crescendo a sequência das agressões à Autonomia Regional, parece ser o mote do poder na República desde que está ocupado por esta direita neo-liberal, retrógrada e centralista do PSD e do CDS tanto ao nível do governo, como da presidência.

Em 2014, os Açores já irão ficar injustamente discriminados devido à específica subida dos impostos, em resultado da alteração da Lei de Finanças Regionais e da redução do diferencial fiscal de 30 para 20% entre o Continente e a Região, incidindo sobre os principais impostos e, em particular, sobre todos os escalões do IVA.

Só a título de exemplo, por causa disso, a subida do bem fundamental que é a electricidade, nos Açores vai ser duplamente penalizadora para as famílias e as empresas, sendo muito superior à do resto do país.

 

 Mas eis senão quando o Senhor Representante da República, que já tinha ensaiado o corte constitucional à manutenção do horário das 35 horas nos Açores por considerar a matéria como sendo da competência exclusiva da Assembleia da República, decidiu agora ir mas longe e, desta vez de forma inédita nos anais da Autonomia, fez aquilo que não deveria, isto é, considerar também da competência exclusiva da Assembleia da República matéria da competência jurídico-política natural da Autonomia, e, em nome de uma igualdade fictícia, enviar para fiscalização preventiva da constitucionalidade o Orçamento Regional de 2014, aprovado pelo Parlamento Açoriano, com base numa medida dele constante e que se encontrava já em vigor desde o ano de 2000: a remuneração complementar dos trabalhadores da Administração Regional e Local.

 

É caso para dizer: não vá o sapateiro para além do chinelo. A discriminação positiva dos Açores, equilibradora dos constrangimentos permanentes que resultam de viver em ilhas distantes entre si e do continente, isto é, a legitimidade da compensação dos custos da insularidade, compõe uma das bases estruturantes da Autonomia, e o Senhor Representante da República, sabe-o certamente, mas isso não o impediu de tomar a decisão inédita de suspender o Orçamento Regional, e nesse caso só o faria porque outros valores mais altos se terão levantado, como seja provavelmente a vontade implícita de quem o nomeou: o Presidente da República!

Estamos assim, em primeiro lugar perante o vibrar de um golpe centralista qualitativamente mais profundo sobre a Autonomia Regional, porque atinge o seu instrumento fundamental de gestão: o Orçamento. Mas não deverá também passar em claro a atitude discricionária e anacrónica de quem considerou poucos dias antes não dever enviar o Orçamento Geral do Estado para fiscalização preventiva, para não abrir precedentes que fizessem paralisar o país, e poucos dias depois considerou que nos Açores tal raciocínio já não era válido e que a Região poderia paralisar, aguardando pela validação ou não do Orçamento que aprovou.

A remuneração complementar é uma conquista autonómica (tal como o acréscimo ao salário mínimo ou o complemento de pensão) e ao ser posta em causa desta forma torpe isso significa que está a ser posta em causa a própria validade da Autonomia. Daí parecer-me óbvio concluir que nenhuma força social ou política responsável na Região se deva quedar por uma posição passiva ou complacente perante este golpe soez e institucionalmente desleal do poder central sobre o direito estatutário de auto-governo dos Açores pelos açorianos.

 

Artigo de opinião de Mário Abrantes, publicado em 1 de janeiro de 2014