Artigo de opinião de Paulo Santos:
É inadmissível condicionar o Orçamento de Estado à anuência da UE. O art.º 161.º da CRP dispõe que a AR aprova o Orçamento, sob proposta do Governo. O art.º 8.º, tantas vezes erradamente inculcado no argumentário da direita, diz que as normas emanadas das instituições da UE, são aplicáveis na ordem interna, com respeito pelos princípios fundamentais do Estado de direito.
Pacífico é que a citada competência da AR ilustra o princípio fundamental, o democrático, em que assenta o Estado. Por outro lado, as normas da UE resultam dos tratados fundadores, e não das reuniões informais do eurogrupo. É pois inconstitucional a submissão do OE à aprovação da comissão, que não tem qualquer competência na matéria.
Mas o desprezo da lei fundamental pela “eurolândia” e seus fãs, ultrapassando o âmbito jurídico, é consciente e de enfoque político. Representa a subserviência do poder eleito aos monopolistas, os quais asseguram a lógica destrutiva do euro, a única que permite especular indefinidamente com as dívidas dos estados. Por isso a união política, guiada pelo conceito de cidadania europeia concretizado em Maastricht, já não existe; foi substituída pelas regras da “zona euro”, aprovadas à margem dos povos pela tecnocracia ultraliberal, e que prevê o envio de orçamentos a Bruxelas. Repugna que “europeístas” da praça, hoje ilustres “troikistas”, dantes proclamando a UE enquanto agregação de povos, agora subscrevam a quebra da união política (a dos cidadãos), em favor da ditadura monetária.
Nesse contexto não existem estados mas regiões administrativas, não somos cidadãos europeus, mas pobres devedores a misteriosos agiotas de um encargo mal explicado. A Europa de ricos e pobres potenciará confrontos sociais e étnicos. Como no passado, as consequências serão terríveis.