Caros amigos e camaradas, caros convidados,
Da tribuna do XI Congresso da ORAA quero saudar os delegados e através deles todo o coletivo partidário que na Região luta em condições duras, como duro é este viver insular e arquipelágico, para dar voz ao nosso projeto político. Saúdo, de igual modo, todos os convidados que acompanham os nossos trabalhos e em particular as camaradas Herlanda Amado e Alma Rivera, que aqui representam, respetivamente, a DORAM e o Grupo Parlamentar do Partido na Assembleia da República.
Estendo esta saudação ao camarada Jorge Cordeiro do Secretariado da Comissão Política do CC que ao longo dos últimos anos tem acompanhado a nossa organização.
Saúdo, por fim, o camarada Jerónimo de Sousa, Secretário-geral do nosso Partido e através dele todo o coletivo partidário a que me orgulho de pertencer.
Camaradas e amigos,
A agricultura e a pesca são ativos regionais cuja importância é reconhecida, mas nem sempre valorizada e defendida pelos partidos políticos que se têm alternado no poder, quer na Região, quer na República. Pode mesmo dizer-se que esses partidos têm contribuído, pela sua ação ou por omissão, para a situação de crise que estes setores estão a atravessar.
O PCP Açores, ao longo do seu histórico de intervenção política, sempre defendeu estes setores da economia regional, desde logo, pela a valorização dos seus trabalhadores assente no princípio da sua formação e, por conseguinte, o aumento do seu rendimento. Mas para o PCP Açores a defesa da agricultura e das pescas teve sempre associado um outro princípio: a redução da dependência externa e da permeabilidade a conjunturas nacionais e internacionais desfavoráveis para as pequenas e periféricas economias, como é a nossa.
Agricultura
Para isso é essencial o aumento e diversificação da produção agrícola, a diferenciação e valorização, com base na origem, dos produtos da agropecuária, seja a carne ou os produtos lácteos.
Apesar das dificuldades que os sectores agrícola e pecuário continuam a atravessar e o crescimento relativo de outros sectores, que assinalamos como positivo, as atividades agrícolas e pecuárias continuam a assumir um peso estratégico na economia regional. Não apenas pela dimensão da riqueza gerada ou do emprego que diretamente criam, mas também pelas atividades relacionadas, a montante e a jusante, com o comércio, transporte, serviços e indústria transformadora.
As dificuldades do sector têm crescido de forma significativa, em especial em resultado das opções políticas resultantes do processo de integração capitalista na União Europeia, sempre com a conivência ativa do PS, PSD e CDS, a nível nacional e regional.
A total liberalização do mercado e a recusa reiterada de criação de mecanismos de proteção dos preços pagos aos agricultores, permite também que as condições de comercialização do leite e da carne açoriana sejam particularmente desfavoráveis para a produção. As grandes centrais de compras e distribuição impõem preços e termos que prejudicam ainda mais o depauperado rendimento dos produtores.
Os agricultores têm ainda de fazer face aos custos cada vez mais elevados dos fatores de produção, a par de uma carga fiscal e contribuições obrigatórias injustas e esmagadoras. A aprovação da Proposta de Lei do PCP para aliviar os encargos sociais e fiscais dos agricultores açorianos no âmbito da agricultura familiar, sendo um fator positivo, não é naturalmente suficiente para inverter esta situação.
Ainda sem uma dimensão económica comparável, outras produções agrícolas assumem uma importância crescente, como o sector frutícola, hortícola, apícola, vitivinícola e, mais recentemente, os modos de produção biológica, com o surgimento de novos produtores e novas explorações, com integração tecnológica nos processos produtivos e produções de elevada qualidade, mas que partilham algumas das dificuldades dos restantes produtores, nomeadamente em termos de encargos e colocação dos seus produtos em condições vantajosas.
O futuro do sector agrícola dos Açores exige a rutura com o dogma liberal da desregulação dos mercados que tem caracterizado as políticas europeias e nacionais. É necessário que sejam reconhecidos os condicionalismos específicos da nossa Região e que sejam criados mecanismos de proteção do rendimento dos agricultores, com uma mais equitativa distribuição do valor ao longo da cadeia de produção/distribuição, limitando o poder das grandes centrais de compra e distribuição, valorizando devidamente a qualidade e a especificidade dos produtos açorianos, garantindo a sustentabilidade da nossa agricultura e a riqueza que gera para os Açores.
Um outro aspeto que para o PCP Açores se assume como um imperativo relaciona-se com a efetiva criação de um mercado interno abrindo assim novas perspetivas ao setor agrícola regional e contribuindo, assim, para o equilíbrio da balança de pagamentos, ou seja, para a redução da crónica dependência externa.
Pescas
A pesca continua a ser um dos sectores fundamentais da economia regional, dela dependendo diretamente e indiretamente milhares de postos de trabalho, bem como outras atividades relacionadas, entre as quais uma indústria transformadora de dimensão relevante. A vasta zona marítima açoriana possui um enorme potencial de geração de riqueza que em grande parte não é explorado, ou melhor a sua exploração não reverte para os pescadores açorianos.
Este sector tem sido vítima também das políticas europeias que, mais uma vez com a cumplicidade ativa de PS, PSD e CDS, impuseram uma gestão do sector contrária aos interesses nacionais e dos Açores, na prática esvaziando a soberania nacional sobre a Zona Económica Exclusiva dos Açores. A definição de quotas de pesca e de outras regras por Bruxelas, muitas vezes sem suficiente fundamentação científica, tem sido feita sistematicamente contra os interesses dos pescadores açorianos e em prejuízo do sector. A Política Comum das Pescas, nas suas sucessivas reformas, assenta numa gestão centralizada, distante da realidade e que despreza a situação específica das pescas regionais e contraria o princípio da gestão de proximidade.
Apesar dos investimentos na renovação e modernização da frota e no aumento da quantidade de pescado descarregado, verifica-se uma profunda e continuada degradação do rendimento dos pescadores. Tal deve-se em primeiro lugar à redução das capturas de espécies mais valorizadas, seja por redução dos stocks disponíveis, seja pela imposição de quotas de pesca, bem como pela descida dos preços da primeira venda em lota. O desaparecimento de mecanismos de proteção como as margens máximas de revenda também contribuíram para isso.
A falta de fiscalização e vigilância marítima, em especial em alto mar, mas também em zonas costeiras e mesmo em áreas protegidas, tem permitido que os recursos piscícolas sejam depredados pela pesca ilegal, saqueando os recursos de pesca na Região e dificultando a recuperação das espécies.
Existindo situações diferenciadas nas várias ilhas da Região, os pescadores são dos trabalhadores pior remunerados nos Açores, auferindo muitas vezes remunerações abaixo do limiar da pobreza. As baixas qualificações, a não existência de contratos de trabalho na esmagadora maioria dos casos e os medievais sistemas de quinhões altamente penalizadores destes trabalhadores também contribuem fortemente para esta situação.
O sistema de compensação ao rendimento dos pescadores, Fundopesca, pese embora as melhorias a que foi sujeito, continua a ser insuficiente para fazer face a esta situação, mas também a devida compensação pelos períodos de paragem biológica (defeso), na maior parte das vezes impostas pela UE.
O futuro do sector da pesca nos Açores passa pela rutura com as políticas seguidas até aqui. A questão central que se coloca é a devida valorização do pescado e a criação de mecanismos que assegurem um rendimento condigno aos pescadores. É necessário recuperar a soberania sobre toda a Zona Económica Exclusiva dos Açores e que a responsabilidade sobre a gestão dos recursos pertença à própria Região, sendo feita numa lógica de proximidade e envolvimento dos pescadores e das suas associações representativas, assente em dados científicos sólidos e fiáveis. Devem ser mais apoiadas as iniciativas que visam o escoamento local do pescado e a sua venda pelas associações, a sua exportação em fresco, bem como o armazenamento do mesmo como forma de fazer frente a períodos em que os mercados pratiquem preços particularmente baixos.
Reconhecendo a necessidade de condicionar o esforço de pesca aos recursos disponíveis, o PCP considera que estes não podem penalizar os pescadores açorianos a quem deve ser assegurado um rendimento condigno pela sua atividade, bem como os respetivos direitos sociais e laborais.
O PCP defende a consagração do contrato de trabalho como a regra nas relações laborais na pesca, salvaguardando um conjunto de direitos básicos aos pescadores e garantindo uma mais justa repartição do rendimento da pesca.
Considerações finais – um novo paradigma de desenvolvimento
Camaradas e amigos,
Para terminar esta minha intervenção, necessariamente breve, sobre agricultura e pescas deixo algumas considerações sobre o que julgamos devem ser os pilares de um modelo de desenvolvimento social e economicamente justo para os Açores.
Um modelo ancorado na terra que sendo exígua é pródiga, no mar que nos dá dimensão e na geografia que nos proporciona centralidade na bacia atlântica, quer olhemos para o Ocidente da diáspora, quer para o Sul macaronésio e lusófono.
Um modelo de desenvolvimento com um forte sector produtivo que assegure um mínimo de soberania alimentar, potenciado por uma indústria transformadora que dê qualidade e dimensão aos produtos da terra e do mar, complementado por um sector de serviços que considere as singularidades açorianas como um recurso único e sustentável, porque diferente e fundado nos equilíbrios entre o homem e o ambiente.
Para atingir este desiderato necessitamos, não só de vontade política, mas sobretudo de implementar de uma estrutura integrada de transportes marítimos e aéreos de mercadorias e passageiros adequado à criação e consolidação de um mercado interno, geradas pela atividade económica, e, que satisfaça o direito à mobilidade e ao não isolamento dos cidadãos, e que por outro lado garanta que a distância aos mercados que nos são periféricos não sejam fator de constrangimento.
Viva o XI Congresso da ORAA!
Viva o PCP!
Viva os Açores!
Aníbal C. Pires, Horta, 7 e 8 de maio de 2022