Se olharmos um pouco para trás, neste tempo que avança com grande rapidez, vamos perceber que muitos acontecimentos políticos, factos e situações, que por vezes nos espantam quando surgem, são, afinal, peças de uma estratégia minuciosamente pensada e executada e que visa consolidar o poder da ideologia que domina.
A realidade portuguesa actual é um exemplo flagrante do que atrás se afirma.
Todos sabemos que este novo Governo existe para aplicar as medidas impostas pela troika.
Todos sabemos, também, que as medidas da troika estão concebidas, não como um conjunto de medidas para resolver um grave problema financeiro, mas antes como um autêntico programa de transformação negativa da organização económica e social do nosso País. Sabemos ainda que esse programa está integrado numa tentativa agressiva e violenta mais geral de impor os dogmas neoliberais que pretendem liquidar partes essenciais dos avanços civilizacionais do século XX.
Para além dos cortes já verificados em 2011, em 2012 o memorando do acordo com a troika (há quem lhe queira aportuguesar o nome para “triunvirato”, procurando atribuir conteúdo linguístico a uma intervenção externa, que de português apenas tem o bode expiatório, mas enfim…), dizia eu, em 2012 o memorando do acordo com a troika, assinado por três partidos com responsabilidades sérias no descalabro político a que o país foi conduzido nos últimos trinta anos, contabiliza um corte de 175 milhões de euros ao poder local e regional e, em 2013, mais 350 milhões, totalizando em dois anos um corte de 525 milhões de euros nos orçamentos do poder local e regional.
Andámos várias semanas “embalados” com a ideia, vendida pelos institutos de sondagens, segundo a qual haveria “um empate técnico” entre o PS e o PSD no que toca ao resultado das eleições. Esse “empate”, proclamado até à náusea, era muito conveniente para o PS, que assim poderia apelar ao voto útil à esquerda, mas era também útil ao PSD que assim poderia limitar o crescimento do PP!
Passámos das sondagens à realidade e percebeu-se que, afinal, o PS estava, aliás por culpa própria, completamente derrotado e que o PSD, com a estrutura de distribuição de votos que ainda vigora, era o inevitável vencedor não absoluto.
5 dias depois de 25 de Abril de 1974, no dia do Trabalhador, um milhão de pessoas, em liberdade e de mãos dadas em Lisboa, assinaram com o país renascido da longa noite salazarista um novo contrato social. Para além do fim da guerra colonial, o povo na rua clamava de viva voz por direitos elementares como o emprego e o subsídio de desemprego, o salário mínimo, as reformas e a segurança social, o direito a férias, à igualdade e à segurança no trabalho, a liberdade sindical, o direito à saúde e à educação, e de imediato estes passaram à lei e à prática. O país emergiu, assinou o contrato e andou para a frente afrontando a pobreza, a miséria e o fosso que separava ricos e pobres.