Opinião

José Decq MotaEstou a escrever esta pequena nota logo depois de conhecer os resultados das eleições presidenciais francesas e conhecer, sem grandes pormenores, os resultados das eleições legislativas gregas.
Independentemente de todo um trabalho de ponderação das causas e efeitos possíveis destes resultados eleitorais há duas certezas que tenho: A primeira é que Hollande ganhou porque assumiu uma posição de recusa da política recessiva brutal que está a ser imposta e defendeu a necessidade de haver políticas de verdadeiro crescimento; a segunda é que o facto dos dois partidos que têm alternado no poder na Grécia terem, em conjunto, perdido metade ou mais dos votos que tinham, significa que os povos não estão dispostos a engolir tudo o que o “poder invisível” quer impor ao Mundo.
Pensando na evolução da Europa nos últimos trinta anos e no evolvimento que os dirigentes socialistas europeus tiveram na definição das políticas da União Europeia, tem que se olhar para o papel que o novo Presidente francês irá ter com justificada reserva. Se isto é verdade, também é verdade que o momento presente é caraterizado por uma tentativa fortíssima de fazer “evoluir” a política de direita europeia, exercida em quadros constitucionais marcados pelas conquistas democráticas e sociais alcançadas pelos povos, para a destruição pura e simples da nossa forma de organizar as sociedades, impondo um modelo institucional ultra neo liberal. Será que a situação objectiva e a força dos povos irão impor mudança de comportamentos?
Aliás, nesta noite de eleições na Europa verificou-se um facto muito curioso. Numa parte da Europa, a França, o candidato socialista ganhou, por aquilo, de melhor, que prometeu e na outra ponta desta mesma Europa, a Grécia, o partido socialista (PASOK) foi o mais penalizado, por ter feito o inverso daquilo que foi prometido em França. Isto  diz muito sobre a actual situação.

Artigo de opinião de José Decq Mota, publicado a 7 de maio de 2012

Mário AbrantesÉ inquestionável que a época atual, na zona europeia, se carateriza pelos avanços consecutivos do neoliberalismo económico, assegurando os seus agentes políticos no terreno um predomínio invejável dos interesses do capital financeiro e especulativo sobre os interesses dos povos e nações.
A revolução russa, a declaração universal dos direitos humanos, ou os sistemas democráticos surgidos no pós-guerra, todos eles significaram uma inversão à predominância de um desumano poder económico, colonialista e explorador, que se desenvolvera e instalara na América do Norte e na Europa, na sequência da revolução industrial do início do século XIX.   
Mas hoje, mau grado os crescentes protestos (confirmados e reforçados neste 1º de Maio que passou) face às injustiças, ao desemprego, à pobreza e às desigualdades também crescentes, um programa comum de austeridade vai-se entretanto impondo contranatura país a país, numa batalha desigual desencadeada pela nomenklatura europeia, sob a capa da necessidade de proceder a “reformas estruturais” que estabeleçam, um novo paradigma económico, o qual não passa afinal (a meu ver) da tentativa de restaurar para o velho continente, tal como acontecia antes, a legitimidade do predomínio absoluto do económico sobre o político.
Uma das boas razões para entender o carater desigual desta batalha, na opinião (que partilho) do filósofo holandês Rob Riemen (ao jornal “I” de 23 de Abril), prende-se com o facto de o neoliberalismo ter conseguido criar um sistema de educação e formação que deixou de manifestar interesse pela pessoa, e passou sobretudo a dar primazia ao tipo de profissões de que a economia necessita. Um sistema de educação e formação montado na base do que cada um pode vir a ter e não do que cada um pode vir a ser. Um tal sistema, pelo poder que emana da posse, debilita a capacidade crítica da sociedade, tornando-a, bem como às regras estruturantes e democráticas que a enformam, perigosamente vulneráveis e manipuláveis.
Para além do aumento do desemprego originado pela batalha lançada pelo governo da República (com o apoio do PS, no acordo troikista) em demanda das supracitadas “reformas estruturais”, o fato de 82 % dos desempregados destas ilhas terem habilitações iguais ou inferiores ao 3º ciclo do ensino básico mostra-nos como aquela batalha desencadeada contra o emprego, os salários e os rendimentos de quem trabalha, se torna ainda mais desigual nos Açores que no resto do País e da Europa.
Nesta batalha, a Autonomia Político-Administrativa pode no entanto interferir na desfavorável correlação de forças em presença e funcionar como uma arma estratégica para contrariar a vaga apologista do domínio absoluto do económico sobre o político que também se procura estender aos Açores...
Caso o parlamento regional ficasse composto por uma maioria absoluta dos mesmos partidos coligados na República, a expressão da vontade popular poderia obviamente ser substituída pela maior dependência regional de um poder central invasivo e desrespeitador da Autonomia, mas, como se tem comprovado (e aí estão, por exemplo, os cortes salariais regionais), também a maioria absoluta de outro partido, o PS, pode, ainda que em grau diferente, proporcionar tal dependência. Na conjuntura atual, só a existência de uma maioria relativa, em consequência de uma maior distribuição de votos e deputados pelas diferentes forças concorrentes, tornará o parlamento regional menos dependente do poder central e mais vinculado à vontade popular.
Nesta batalha desigual importa pois aos açorianos, em tempo oportuno e mais do que nunca, usar de fato a Autonomia com a finalidade para a qual ela foi criada, isto é, como uma arma a seu favor...

Artigo de opinião de Mário Abrantes, publicado a 2 de maio de 2012

José Decq MotaNestes últimos dias sobressaem duas datas muito importantes nas nossas vidas: 25 de Abril e 1 de Maio.

Em 25 de Abril de 1974 abriram-se, aos Portugueses, as portas da democracia, da paz, do progresso e da justiça social.

O 1º de Maio, com a sua profunda carga histórica, representa a capacidade de conquista dos trabalhadores por conta de outrem, a capacidade de recusar a sobre-exploração brutal que vigorava e a capacidade de demonstrar o valor próprio do trabalho no conjunto das relações económicas e sociais.

Mário AbrantesQuando se anuncia como bom que os custos do trabalho em Portugal estão a baixar de tal forma que já conseguem atrair investimento externo para o nosso país tão bem como para México ou para a India; que a política que Portugal necessita para combater a crise e satisfazer entidades externas é a política de favorecimento da banca, do capital financeiro e dos grandes grupos económicos, e, simultaneamente, a da austeridade e do empobrecimento para o povo; que para entesourar, visando cumprir compromissos (de validade questionável numa boa parte da sua extensão) é inevitável retirar aos portugueses o direito universal de acesso à saúde; é necessário fechar escolas, aumentar para 30 o número de alunos por turma, e se torna impositivo extinguir freguesias por decreto; que se devem promover cortes generalizados nos abonos sociais, nas pensões e nos rendimentos de subsistência, no preconceito de que, em geral, tais rendimentos constituem injustas regalias e não direitos, porque incidem sobre indigentes e preguiçosos e não sobre pessoas sérias e honestas; que não existe outro caminho, apesar de nunca este ter sido eleitoralmente sancionado, senão o de decidir nas costas de todos e à má-fé cortar reformas antecipadas, cortar salários e subsídios de férias e de Natal para sempre, e preparar despedimentos na administração pública; que, para salvar Portugal, o aumento galopante do desemprego se torna inevitável e não tem forma de ser combatido; que à geração mais nova se impõe o comprometimento do seu futuro, em nome do imaginário futuro das gerações seguintes; que o recurso à emigração não é mais senão a retoma do tradicional fado dos portugueses, etc. etc. etc., vêem-me à memória, os caminhos e as razões de Abril, nesta data em que escrevo...

Fazer Abril em 1974 foi necessário para salvar Portugal de uma ditadura opressiva, violenta e obscurantista que enaltecia a pobreza, enquanto protegia as famílias opulentas e os monopólios (ou oligopólios) económicos a elas ligados, atentava contra a dignidade humana, perseguia, prendia, torturava e assassinava os oposicionistas, proibia os partidos políticos e o voto das mulheres ou dos analfabetos na farsa suas eleições, oprimia os povos das colónias e mantinha uma guerra sem saída contra eles, desde 1961, a qual estava a destruir física e espiritualmente toda a geração jovem de então, contabilizando-se entre os militares portugueses, até ao golpe revolucionário do 25 de Abril, 8.300 mortos e 14.000 deficientes físicos...

Fazer Abril em 1974 foi necessário para salvar Portugal e proporcionar o desenvolvimento, promovendo a emancipação do seu Povo através da instauração da Democracia no conjunto das suas componentes intrínsecas (política, económica, social e cultural). As liberdades, os partidos políticos, os sindicatos, os direitos das mulheres e das minorias, a participação e a co-gestão empresarial, o fim dos latifúndios, a produção e o emprego, mas também a saúde e a educação universais, a habitação, o salário mínimo e as reformas.

Muito embora isso até já aconteça nalguns casos, sem dúvida que, de forma geral, não regressámos, em 2012, ao 24 de Abril de 1974. Mas, agora sob a bandeira da democracia formal e da “bandeira à lapela” do poder político vigente estamos, como dizem os militares de Abril: “a regressar à condição de protetorado, sem capacidade autónoma de decisão, protegendo os privilégios, desvalorizando o trabalho e aumentando a pobreza e a exclusão social. A Constituição Portuguesa está a ser rompida e a dignidade dos portugueses a ser vilipendiada”. Pouco escapa à fúria revanchista, ao ajuste de contas dos novos herdeiros de um Portugal sem Abril.

E, sem Abril, na época atual, Portugal nem é livre, nem é democrático… nem é português.

 

Artigo de opinião de Mário Abrantes, publicado em 27 de Abril de 2012

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