Opinião

mario_abrantesA repartição real do roubo orçamental (OE) para o próximo ano, demonstra bem a mentira profunda e a marca de classe que se esconde atrás das sucessivas declarações públicas sobre equidade e justiça do governo cavaquista de Passos e Portas: 84% de penalização acrescida em 2014 (a somar à de 2013) sobre os trabalhadores e os que já trabalharam, através dos salários (tanto públicos como privados), pensões e fiscalidade, e 4% apenas de penalização sobre o capital, particularmente sobre rendas, lucros e dividendos.

A quebra dos salários de 10% ao ano, nos últimos 3 anos, tanto no setor público como no privado (por arrastamento), mais o roubo à função pública previsto para o próximo ano, transferem coercivamente rendimentos do trabalho para o capital que superam em muito os ridículos 4% destinados pelo governo às penalizações sobre este último...

A quebra sucessiva e revoltante das reformas e pensões sofrerá com o OE em 2014 um cúmulo de cortes por diversas vias, a partir dos 600 euros.

Mas indiretamente as classes sociais intermédias e as mais pobres (que incluem quase todos os trabalhadores e reformados), serão ainda sobre penalizadas pela prevista continuação dos cortes substancialmente criminosos na Saúde e Educação, em 2014, já que o seu aumento continuado ao longo dos últimos 3 anos colocará estes serviços à beira da rotura.

E não chega. A asfixia da vida das famílias agrava-se em 2014, através de mais cortes nos subsídios de emprego, doença e nos abonos (agora nos abonos por falecimento), a juntar ao fim da cláusula limitativa do IMI.

Quanto às pequenas e médias empresas, além do investimento público reduzido a zero, da manutenção do IVA máximo na restauração, ou da quebra geral do mercado interno, verão as suas imensas dificuldades de subsistência aumentarem por via do agravamento das condições do pagamento especial por conta (IVA de caixa), enquanto só as grandes empresas e os grandes grupos económicos e financeiros beneficiarão da baixa prevista do IRC.

Os pálidos sinais de recuperação, mentirosamente empolados pelo governo de Coelho/Portas e logo suportados por muitos comentadores políticos e económicos vendidos ao poder, resumem-se afinal a pequenas recuperações na balança comercial externa e a pequenas baixas da taxa de desemprego (muito favorecidas pelo aumento da emigração), e serão totalmente cilindrados pela aplicação do OE proposto para 2014.

O défice público de 2013 (muito acima do previsto) para chegar a 4% do PIB em 2014, conforme se propõe, é impossível sem novo pacote pós-troika da UE e BCE. O crescimento previsto de 0,4 do PIB é assim uma utopia. A recessão e o empobrecimento ficam, e o desemprego aumentará.

As primeiras vítimas alvo desta política criminosa e sem resultados em 2014 (agravada nos Açores pelo aumento de impostos resultante da nova Lei de Finanças das RAA) serão os funcionários da administração pública incluindo os da Administração Regional e Local dos Açores, apesar das almofadas ditas compensatórias anunciadas pelo governo de Vasco Cordeiro.

Um sinal de descontentamento e revolta, mas também um contributo para a mudança deste caminho de mentira e roubo que está a ser prosseguido pelo governo vende-pátrias, será certamente dado pela greve geral da Administração Pública da próxima sexta-feira dia 8. Um sinal tão necessário de ser dado em Trás-os-Montes, como em Lisboa ou nos Açores.

 

Artigo de opinião de Mário Abrantes, publicado em 5 de novembro de 2013

mario_abrantes"Tudo o que se dizia e que temíamos do comunismo – que perderíamos as nossas casas; que nos retirariam as nossas poupanças; que nos obrigariam a trabalhar eternamente por escassos salários; que ficaríamos sem ter voz para contestar o sistema – converteu-se em realidade sob o sistema capitalista" (Jeff Sparrow, escritor australiano).

Ironia da história, à qual eu acrescentaria que, em Portugal sob o salazarismo, os mais primários anti-comunistas costumavam assustar as pessoas analfabetas e de fraca formação, ou forçar as crianças a comer a sopa, ameaçando que "na Rússia os comunistas matavam os velhinhos com uma injeção atrás da orelha ou que comiam criancinhas ao pequeno-almoço...". Sendo certo que se tratavam de tolices sem sentido, elas começaram, sob a batuta do neo-liberalismo dominante, a ter alguma infeliz semelhança com a realidade quando se retiraram e retiram sucessivas condições de sobrevivência aos mais idosos ou se condenam cada vez mais crianças a atravessar situações de carência alimentar ou de fome continuadas.

Mas as semelhanças entre os atributos do vocabulário anti-comunista e a realidade com a qual o capitalismo nos confronta hoje não se ficam por aqui nem preciso de ser eu a continuar a estabelecê-las. Freitas do Amaral, um insuspeito antigo dirigente do CDS, afirmou no princípio desta semana em entrevista à Lusa que, a continuarmos assim, "caminhamos para uma ditadura"...

Na Alemanha, derruba-se um muro em 1989 em nome da liberdade, da prosperidade e da melhoria das condições de vida das pessoas, mas a triste realidade veio mostrando desde essa data que, tanto de um lado como do outro do antigo muro, as injustiças e as desigualdades aumentaram, e o desemprego e o empobrecimento (até a guerra ressurgiu) alastraram desde então por toda a Europa.

As preocupações teóricas sociais subjacentes e justificativas da reunificação e alargamento da chamada construção europeia, afinal transformaram-se em práticas de ditadura dos mercados e em predomínio ilegítimo do poder económico sobre o poder político nos estados-membros da UE. Constituiu-se um diretório dominante no qual pontifica em primeiro lugar a mesma Alemanha onde o muro foi derrubado. Para lá de tal diretório reserva-se aos outros estados-membros a condição neocolonial da subserviência política com vista ao desmantelamento das suas estruturas produtivas (de que foi principal agente em Portugal, enquanto primeiro-ministro, o atual ocupante do cargo da presidência da República) e das atribuições sociais do Estado no seu seio (que começaram de forma continuada com o governo Sócrates e de que está sendo o principal agente, à sombra protetora da presidência da República, o governo de Passos Coelho e Paulo Portas).

Nenhum comunista portanto está a fazer o que aos comunistas se dizia estar reservado. Mas o que aos comunistas se dizia estar reservado, está apesar de tudo a ser feito. A proposta de Orçamento de Estado para 2014 assusta qualquer criancinha ou idoso, mas é real e foi concebida por quem nada tem de comunista, sequer de humanista. Foi concebida pelo capitalismo neo-liberal dominante na Europa e é para ser executado pelos seus agentes em Portugal.

O direito à felicidade, à liberdade, à segurança e a uma vida digna exigem que um outro Muro de Berlim venha a ser derrubado. E sê-lo-á, de preferência mais cedo que tarde, em nome da vida...

 

Artigo de opinião de Mário Abrantes, publicado em 30 de outubro de 2013

mario_abrantesApesar dos incomensuráveis sacrifícios a que a esmagadora maioria dos portugueses foi e continua a ser submetida em 2013, onde se destaca, de entre muitos outros, pela sua dimensão, o aumento dos impostos, em particular do IRS, tudo em nome da necessidade “incontornável” do cumprimento da meta do défice orçamental definida pela troika estrangeira e acertada com o governo vende-pátrias de Passos Coelho e Paulo Portas, a meta não foi cumprida! O défice “incontornável” combinado entre os algozes deste martirizado povo foi de 5,5%, mas o défice previsto situar-se-á entre 5,8 e 5,9%.

E o que diz a troika estrangeira a este falhanço? Diz, pasmem queridos leitores, que “não se incomoda”! Repito: “não se incomoda”!

Mas então andamos todos a brincar aos sacrifícios e ao aumento dos impostos por causa do limite máximo do défice público, e das imposições de Bruxelas nesse sentido, e afinal Bruxelas não se incomoda com o falhanço…porque a diferença se deveu à recapitalização do Banif. Porque o excedente do défice foi para entregar a um Banco uma quantia retirada do tesouro público equivalente a 0,4% do PIB nacional!

Portanto, tratando-se de entregar dinheiro público à banca privada, Bruxelas e o FMI deixam de ficar aflitos com o incumprimento das metas por eles impostas, mesmo que isso tenha significado sacrifícios adicionais e impiedosos aumentos de impostos sobre o povo.

E de seguida, em lugar de emendar a mão (tal como a ameaça de eleições antecipadas que o atual governo grego atirou à cara da troika quando esta pretendia impor mais cortes), aí está, assinado pelo governo da República, mais um contrato “incontornável”, que implica novos cortes nos rendimentos dos portugueses, para em 2014 garantir a meta de 4% do défice público. Acumulando ao desmesurado leque de sacrifícios que vem sendo imposto de há 3 anos a esta parte, sem nenhuma outra finalidade objetiva que não seja o cumprimento de contratos assumidos pelo governo português, através da troika, com os credores nacionais e internacionais da dívida em crescendo, aí está do lado de dentro de casa um sem número de contratos, principalmente com salários e pensões da administração pública e com pensões de sobrevivência que, esses sim, podem ser (mesmo inconstitucionalmente) rasgados pelo governo Coelho/Portas. E se não forem, lá está a ameaça do segundo resgate à porta, como se o “programa cautelar” que o mesmo governo quer negociar com a troika não fosse já algo de equivalente…

Para cumprir uns, que só a acumulação bancária permite violar, rasgam-se outros para pagar juros da dívida à banca e à finança, os quais em 2014 já atingem montantes superiores a 1/3 das despesas com a Administração Pública (mais de sete mil milhões de euros).

Em resumo: Neste momento em Portugal, pela mão de um governo vende-pátrias e com a orientação de Bruxelas e do FMI, todo o contrato é violável e toda a pobreza social é cultivável, desde que daí resulte transferência e acumulação de capital em mãos de banqueiros, agiotas e grupos financeiros.

E essas transações parecem ser de tal modo urgentes (?) que deparamos com um Presidente da República estranhamente disponível para, em lugar de precaver os seus efeitos nefastos no Orçamento de Estado, fechar os olhos com tanta mais força quanto mais inconstitucionalidades elas transportem no ventre.

 

Artigo de opinião de Mário Abrantes, publicado em 23 de outubro de 2013

mario_abrantesO autoritarismo político está de regresso, sob outras formas e noutras circunstâncias é certo, mas após um interregno de 39 anos aí está ele a insinuar-se em todas as frentes. Antes o fascismo tinha os interesses da “Pátria” como pretexto, agora o novo candidato ao exercício do poder absolutista tem os interesses do “País” como pretexto.

Prova direta disso é o comportamento revanchista e intolerável do governo perante a manifestação popular organizada pela CGTP-In para o próximo sábado e que incluía a travessia da Ponte 25 de Abril. Todas as razões de segurança invocadas para impor a proibição da travessia da ponte, nunca o foram antes para as dezenas de maratonas com milhares e milhares de participantes que já fizeram esse percurso ao longo de anos.

Prova direta disso é, após mais um falhanço das metas para 2013, a imposição de um orçamento para 2014 contendo mais austeridade ainda que o do ano corrente, composto por medidas restritivas soltas e elaboradas em cima do joelho, debitadas sobre os portugueses às pinguinhas (para baralhar a soma) antes da sua apresentação oficial, sem qualquer ponta de respeito por eles nem pelo seu futuro colectivo e onde apenas beneficiam de facto as muito grandes empresas (por via do anúncio da baixa do IRC), mas se consagram por tempo indeterminado, e sem definição de objetivos, os cortes nos salários, pensões e outros rendimentos e o empobrecimento da esmagadora maioria dos cidadãos.

Prova direta disso é o governo, com o apoio do PR, que jurou cumprir a Constituição antes de tomar posse dos cargos, falar em nome do “País” para contrariar a sua Lei Fundamental e, face às acrescentadas medidas restritivas que pretende fazer aprovar, formular novas ameaças ao Tribunal Constitucional, apoiado sem pudor por mais uma onda de declarações públicas de intromissão internacional, do FMI e outras entidades europeias, pressionando ilegitimamente e sem vergonha a República Portuguesa e a sua Constituição. 

“Não é preciso alterar a Constituição, para implementar as reformas necessárias ao País…”(Passos Coelho). Mas nunca um governo atacou tanto a Constituição e as outras instituições de poder, num Estado de Direito e numa República Democrática. É retórica pura, enleada em traiçoeira fraseologia pseudo-académica, de um governo maníaco e corrupto cujo primeiro-ministro é o único que se considera com legitimidade para definir aquilo que é necessário ao País, mesmo que seja contra tudo e contra todos, isto é, contra o próprio País.

“Se eu falhar, é o País que falha…” (Passos Coelho). O país sou eu, é o que este súbdito dos mercados externos está a pretender dizer. É já uma questão pessoal para quem tem falhado desde o início mas continua amarrado ao poder pela mão de Cavaco e Silva para prestar um serviço estranho aos interesses nacionais. Em Portugal quem manda? Salazar, Salazar, Salazar! (respondiam os súbditos de então). Em Portugal quem manda? Passos Coelho, Passos Coelho, Passos Coelho! (publicitam os seus reais mandantes de hoje).

Se este governo se mantiver e se tudo se acertar de acordo com os planos que, pelos seus mandantes, lhe vão sendo entregues e com cujo cumprimento cego Passos Celho se comprometeu, é outro país que está a ser criado, imposto pela força e pelo autoritarismo, moldado não pela Democracia, mas pelos Mercados (isto é, pelo capital financeiro) e por outros países. Aqui sim, é caso para dizer com toda a propriedade: “O País falhará!”

 

Artigo de opinião de Mário Abrantes, publicado em 20 de outubro de 2013

mario_abrantesNos Açores, ao contrário do restante território português, a abstenção parou de subir. Bom presságio para uma desejável maior participação futura dos cidadãos na regulação política dos seus destinos.

Apesar dos esforços feitos em contrário por quem, decidindo envergar a camisola do atual primeiro-ministro, preferia fazê-la caminhar pela bitola carneristo-partidária, a jovem e dinâmica freguesia urbana de Ponta Delgada: Santa Clara, optou inequivocamente por continuar em regime de auto-gestão dos seus cidadãos, como tem sempre estado desde a sua constituição administrativa há oito anos. Uma lição de democracia de base, num território concelhio que se apresentou infelizmente ainda mais bipolarizado pelos partidos que se têm alternado no poder.

Em Vila Franca do Campo, o candidato da CDU merecia bem mais, mas enfim. Vai ser o vereador que se apresentou por uma lista de cidadãos, a desempatar nas reuniões de Câmara. Já dá para estragar o joguinho do exercício da política que, muitas vezes dispensa o povo em favor do mandonismo caciqueiro.

A vitória nacional histórica do PS deveu-se a quem em primeiro lugar? À política desastrosa do Governo. Mas há mais uma força política vitoriosa: a CDU. E uma das razões parece estar em que muitos daqueles que cederam em eleições anteriores à pressão do chamado voto útil, agora, após a sua passagem pela experiência caciqueira do PS e do PSD, resolveram manifestar o seu arrependimento de forma clara.

Na Madeira, além de todo o resto que perdeu, João Jardim (o mais antigo cacique do pós-25 de Abril) perdeu o Funchal. A culpa de quem foi, por este horrendo facto histórico? Ele próprio se queixou: foi por usar a camisola do actual primeiro-ministro. Teria bom remédio, bastava despi-la então...

Mas estas eleições vieram também demonstrar em toda a sua dimensão que existe em Portugal um super-cacique do PSD/CDS, responsável máximo pela situação que estamos a viver e que como tudo indica, se não houver muita resistência e muita luta popular, tenderá a agravar-se ainda mais a breve trecho. Não, não estou a falar de Passos Coelho e do seu rumo surdo à voz dos portugueses, estou a falar daquele que após ser eleito chegou a autoproclamar-se o "Provedor do Povo".

Os resultados eleitorais confirmaram que o governo PSD/CDS só consegue aguentar-se no ativo e fazer a política que faz, apesar de podre, corrompido, desacreditado até pelos seus mais próximos e totalmente minado pelos interesses egoístas da alta-finança europeia e nacional, porque alguém está a impedir que a Democracia funcione, e esse alguém, utilizando o cargo de Presidente da República, resolveu renegá-lo em definitivo e vestir-se com a camisola partidária do governo central.

Enquanto Ramalho Eanes e muitas outras personalidades insuspeitas manifestavam opinião diversa, aquele que por obrigação própria deveria ser a mais importante imagem da cidadania - o Presidente da República – resolveu tomar abertamente o lado do Governo contra a vontade do povo e, procurando encobrir as evidências, veio usar o sábado de reflexão (interferindo fora de campanha no sentido de voto dos portugueses) para afirmar que o resultado das eleições autárquicas não deveria ser extrapolado para a situação nacional.

O povo pronunciou-se, a extrapolação foi evidente, o Governo saiu profundamente derrotado e merecedor de ser varrido com urgência, mas o super-cacique do alto do seu poleiro já antes prevenira em quem iria votar...

 

Artigo de opinião de Mário Abrantes, publicado em 3 de outubro de 2013

Subcategorias